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e Outras Artes
por Maurício Caleiro
O Brasil está prestes
a promover a maior entrega de patrimônio público de toda a sua
história – e, uma vez mais, trocando um grande lucro futuro por um
pequeno lucro imediato. Trata-se da privatização do campo de
petróleo pré-sal de Libras, considerado "não só o maior
campo do mundo, mas da história", nas palavras de Sérgio
Gabrielli, presidente da Petrobras no governo Lula.
A negociata envolve
condições específicas que a maioria dos brasileiros desconhece e
que a mídia, interessada em agradar o mercado, tem negligenciado:
nas explorações de petróleo convencionais, anteriores ao Pré-sal,
em que se sabia da existência do óleo mas desconhecia-se em qual
quantidade e sob o custo de quantas prospecções, estipulava-se, em
troca do direito de prospecção, um "bônus de assinatura"
– de cerca de 15% do valor estimado do petróleo - a ser pago para
o governo pelo concessionário, o qual passava a arcar com o eventual
lucro (ou prejuízo), descontados os royalties. Dessa maneira, o
governo garantia um lucro mínimo razoável sem ter de investir e o
investidor praticava uma ação de risco: apostava na rentabilidade
do investimento e, em caso de sucesso, seu lucro se confirmava e
aumentava à medida que volume de petróleo prospectado superasse os
custos. O jogo jogado do capitalismo.
Lucro fácil
A lógica do Pré-Sal é
– ou deveria ser - outra, pois nele as perfurações-teste já
foram feitas e sabe-se de antemão não só a quantidade do petróleo
disponível, mas o custo de sua extração. Não há risco. No caso
do campo de Libra, haveria, segundo o governo, 14 bilhões de barris
de petróleo, ou cerca de 3 trilhões de reais (mas denúncias feitas
diretamente por técnicos de alto escalão da Petrobras alegam que o
volume de petróleo chegaria ao triplo do declarado). Seja como for,
o bônus de assinatura para exploração do campo foi estipulado pelo
governo em meros R$ 15 bilhões (ou seja, 0,5% do valor total
declarado). Em bom português: o governo está entregando
voluntariamente e de mão beijada para os grupos multinacionais o
direito de explorar, sem riscos e com ampla margem de lucros, a maior
das riquezas nacionais recentemente descobertas, da ordem de centenas
de bilhões de dólares.
Pior: a atual
legislação que rege o Pré-Sal (Lei nº 12.351), a qual o governo
Lula fizera aprovar, determina que, por suas características, um
campo como o de Libras, justamente por sua importância para os
interesses nacionais, deveria ser considerado "área
estratégica", estabelecendo em seu artigo 12 que, nessa
condição, "a Petrobras será contratada diretamente pela União
para a exploração e produção de petróleo, de gás natural e de
outros hidrocarbonetos fluidos sob o regime de partilha de produção".
Com o campo de Libras aos cuidados da estatal, os lucros não só
ficariam integralmente no país como os termos da partilha tenderia a
ser mais benéficos aos cofres da União.
Desprezo pela lei
Mas o governo Dilma,
ávido por "fazer caixa" no curto prazo, preferiu
simplesmente ignorar a lei e, indo na contramão do que sempre
defendeu, voltar a utilizar um modelo de privatização extremamente
similar ao adotado por FHC, não fosse a diferença retórica de que
se trata de uma "concessão" por tempo determinado, e não
de uma transferência para sempre. Trata-se de uma diferença que, no
caso do pré-sal, não quer dizer absolutamente nada, já que o tempo
de concessão será mais do que suficiente para dragar todo o
petróleo disponível - e o valor de um poço de petróleo vazio é
nulo. Ao povo brasileiro restará as migalhas relativas aos
royalties.
Enquanto os setores
mais engajados - sindicalistas, acadêmicos, militantes virtuais,
especialistas no tema – se movimentam para denunciar e alertar a
sociedade para esse flagrante crime de lesa-pátria, boa parte dos
governistas – inclusive muitos críticos ferrenhos da privatização
promovida por FHC - prefere, uma vez mais, fechar os olhos para as
gravíssimas consequências de um ato do governo que
incondicionalmente apoiam e aquiescer calados.
Agenda partidária
O governismo
consolida-se, assim, como uma força conservadora na acepção
precípua do termo, privilegiando sempre a manutenção do poder nas
mãos da aliança capitaneada pelo PT acima de qualquer outra agenda,
ou seja, colocando os interesses do partido ao qual apoiam acima dos
interesses do país e do povo brasileiro. De modo que não seria
exagero situar o governismo, hoje, como uma força politica à parte
e, ao contrário de seus concorrentes à esquerda e à direita, pouco
afeita aos aspectos programáticos ou ideológicos inerentes às
decisões do governo que apoia. Interessa-lhes o poder pelo poder,
mesmo se a manutenção deste significar abdicar de meios e recursos
que assegurariam um salto qualitativo às futuras gerações.
Poucos casos seriam
mais ilustrativos disso do que o apoio, velado ou explícito, que dão
ao crime de lesa-pátria inerente ao leilão do campo de Libras.
Ainda que se aceite, com muita boa vontade, que uma parcela dos
governistas o faça por desconhecimento de causa, a maioria que apoia
a outrora tão criticada privatização das riquezas naturais
nacionais sabe que a troca de um grande lucro futuro por um pequeno
faturamento imediato permitirá ao governo Dilma sair do aperto
financeiro em que se encontra e, a menos de um ano das eleições,
ter capital para investir pesadamente em obras e marketing que hão
de render forte apelo eleitoral. Pior: a parte mais enfronhada da
militância intui que, de alguma forma, a milionária transação do
pré-sal acabará por beneficiar também os cofres do próprio
partido, às vésperas de uma eleição que se afigura acirrada.
Às ruas!
Em resumo, o Brasil
está, mais uma vez, prestes a entregar, a troco de banana, suas
riquezas naturais findáveis a corporações internacionais, mesmo
dispondo de uma empresa altamente capacitada para explorá-las, o que
aumentaria exponencialmente o lucro para os cofres públicos.
Enquanto isso, a mídia, aliada ao capital internacional, se omite e
os fanáticos da seita governista – açulados por blogueiros que se
dizem de esquerda – batem palma para mais um processo de submissão
do país à exploração colonial estrangeira. Desta vez, de forma
voluntária.
Só o povo brasileiro
pode barrar essa transação nefasta, imoral sob diversos aspectos e
sobretudo contrário aos interesses da cidadania. Mais do que nunca,
é preciso que os brasileiros defendam os seus direitos - junto às
instituições, na internet, nas ruas - e manifestem-se de forma
contundente e inequívoca contra esse ato vil de entreguismo, misto
de traição eleitora e crime de lesa-pátria cujos efeitos afetarão,
por décadas, gerações de brasileiros.
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