domingo, 14 de julho de 2013

O Golpe Não Começou em 1964







Texto do livro 68, a geração que queria mudar o mundo – Relatos, pode ser baixado em http://migre.me/5qSr4.  Em Urariano Mota: a história viva dos anos da ditadura tem uma bela apresentação do livro. Vale a leitura. leia ABAIXO



O Golpe Não Começou em 1964


Leoncio de Queiroz

Na República Velha, o voto não era universal nem secreto. Analfabetos e mulheres não votavam. Não havia urnas onde o voto fosse depositado em um envelope fechado. O eleitor registrava seu voto em um livro, geralmente sob a supervisão do cacique local. Além disso, depois de eleitos, os candidatos tinham de passar por um crivo denominado,então, de “reconhecimento dos poderes”, isto é, podiam ser aceitos ou “degolados”conforme a conveniência da maioria da Assembleia Legislativa ou do Congresso eleito. O resultado era uma imbatível oligarquia de latifundiários – os “coronéis” –, dominada por Minas Gerais e São Paulo, que se revezavam no poder. Não havia limite à jornada de trabalho, nem proibição de trabalho infantil, nem estabilidade no trabalho, nem férias,nem 13º salário, nem indenização trabalhista, nem aposentadoria.

A revolução de 30 foi o principal marco na História do Brasil depois do descobrimento. Representou uma transformação sem precedentes, muito mais significativa do que a Independência ou a Proclamação da República. Com ela, o coronelismo rural perdeu sua  hegemonia e pôde esboçar-se um início de industrialização. Foi Getúlio Vargas quem criou o Estado brasileiro como ele existe hoje e lançou as bases ainda vigentes da democracia burguesa. Embora o voto universal – que inclui os analfabetos – só tenha sido incorporado na Constituição de 1988, a eleição para a Assembleia Constituinte, em 1933, foi a primeira realizada com os votos femininos e por meio de voto secreto, assim como a primeira em que as mulheres puderam candidatar-se. O Governo do Getúlio criou a Legislação Trabalhista e a Justiça do Trabalho para garanti-la. Instituiu as férias, a estabilidade, a jornada de trabalho de oito horas, criou os institutos de previdência e proibiu o trabalho infantil. Getúlio nacionalizou o subsolo brasileiro (os recursos minerais) e fundou a Companhia Vale do Rio Doce, a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e aFábrica Nacional de Motores (FNM). A construção da CSN e da FNM foi negociada com o governo de Franklin Roosevelt, que se comprometeu a fornecer a tecnologia e os financiamentos necessários em troca da adesão brasileira aos países aliados na Segunda Guerra Mundial e a permissão para instalar uma base aérea dos Estados Unidos no RioGrande do Norte.

Nem tudo foram rosas, porém. À esquerda dos revolucionários de 30, organizados na Aliança Liberal, formou-se uma frente, em torno de um programa de conteúdo antifascista e antiimperialista, liderada pelos comunistas e pelos tenentes revoltosos da década de 20, chamada de Aliança Nacional Libertadora (ANL). Luís Carlos Prestes havia liderado a coluna de tenentes rebelados, que ficou conhecida como a Coluna Prestes e que, de 1925 a 1927, percorrera grande extensão do país, pregando reformas políticas e sociais e dando combate a tropas dos governos de Artur Bernardes e de Washington Luís, para finalmente retirar-se, invicta, para o território boliviano. Prestes, que passou a ser chamado de Cavaleiro da Esperança, teve, no exílio, contato com comunistas brasileiros e argentinos e passou a estudar o Marxismo. Quando retornou ao Brasil, já membro do então denominado Partido Comunista do Brasil (PCB), foi escolhido para a presidência da ANL. O crescimento vertiginoso deste movimento assustou Getúlio, que o colocou na ilegalidade. O PCB e parte do movimento tenentista passaram a planejar uma insurreição popular contra o Governo. Em 1935, ocorreu, prematuramente, em Natal, um levante detropas do Exército que contou com o apoio do PCB local e teve grande adesão da população. Os comunistas e os tenentes sediciosos, apanhados de surpresa, tentaram eclodir a insurreição. Houve levantes em guarnições do Recife e do Rio de Janeiro, mas todas essas revoltas foram rapidamente sufocadas. Desencadeou-se, a seguir, uma grande caça aos comunistas, socialistas e membros da ANL. Os dirigentes do PCB foram todos presos. Prestes e sua mulher, a alemã Olga Benário, caíram em março de 1936.

A nódoa que denigre o Governo de Vargas consiste na perseguição à ANL e nos maustratos e nas torturas infligidas aos comunistas e tenentes aprisionados. Terríveis os relatos da tortura sofrida pelo alemão Harry Berger e sua mulher, Elisa, enviados pela Internacional Comunista para assessorar a direção do PCB. Preso embaixo de um vão de escada, Berger ficava dias sem poder dormir, sendo torturado por meio de um arame enfiado na uretra cuja outra ponta era aquecida até ficar em brasa. Era tratado como um bicho, o que levou o famoso advogado Sobral Pinto a requerer, em sua defesa, a aplicação da Lei de Proteção aos Animais. Harry Berger enlouqueceu na prisão. Prestes passou nove anos em prisão solitária. O mais hediondo crime do Governo, entretanto, foi deportar a esposa grávida de Prestes, judia e comunista, entregando-a aos nazistas. Olga foi executada em um campo de concentração. Leocádia, a mãe de Prestes conseguiu resgatar e criar a neta – Anita Leocádia. O principal responsável por todas essas atrocidades foi o chefe de 50 polícia Filinto Müller, egresso do movimento tenentista. Getúlio, contudo, poderia ter-se empenhado em poupar a companheira e a filha do adversário vencido, mas não o fez.

Getúlio, portanto, foi um protagonista controverso. Se por um lado perseguiu cruelmente os que estavam à sua esquerda, por outro introduziu reformas profundas, iniciou a industrialização e criou instituições que se consolidaram na vida nacional. Tudo sem abalar a hegemonia do capital e do latifúndio.Os Estados Unidos nunca lhe perdoariam a nacionalização do subsolo, que antes era concessão da empresa estadunidense Farquhar, nem a criação da Cia. Siderúrgica Nacional, que conferia relativa auto-suficiência industrial ao Brasil.

Com o fim daSegunda Guerra, surgiram duas campanhas antagônicas, ambas pela convocação de uma Constituinte: uma por eleições sem Getúlio e outra, fortíssima, o Queremismo, por eleições com Getúlio. Apesar de já haver convocado as eleições, Getúlio foi deposto, em outubro de 1945, no auge de sua popularidade, pelos mesmos chefes militares que sempre lhe deram apoio e participaram de seu Governo: Góes Monteiro e Eurico Dutra. É pura falácia a versão de que a ditadura de Vargas foi derrubada por um amplo movimento de retorno à democracia. Getúlio foi removido por seus ministros, que sempre participaram de suas decisões e que continuaram dando as cartas. As eleições que se seguiram foram vencidas por Eurico Dutra, unicamente devido ao apoio que este recebeu de Vargas. São paradoxos da política brasileira: Getúlio apoiou o general que o depôs e, anos mais tarde, recebeu o apoio de Prestes, a quem havia perseguido tão implacavelmente.

Dutra teve um mandato marcado pelo entreguismo, pela subserviência aos interesses dos Estados Unidos, pelo desperdício das divisas acumuladas durante a guerra com importação de Pirex e Cadilacs, pelo arrocho salarial, pela repressão aos sindicatos e por uma feroz perseguição aos comunistas. Estes, que haviam sido anistiados no fim do Governo do Getúlio e que puderam participar das eleições, conquistando uma representação significativa na Assembleia Constituinte e, inclusive, a maior bancada na Câmara Municipal do Distrito Federal, foram novamente postos na ilegalidade e tiveram seus mandatos cassados.

Em 1950, Getúlio candidatou-se à reeleição. Carlos Lacerda, um ex-comunista recrutado pela direita, lançava-se como líder do mais histérico golpismo, ao escrever: “O Sr. Getúlio Vargas, senador, não deve ser candidato à presidência. Candidato, não deve ser eleito. Eleito, não deve tomar posse. Empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar”.

Getúlio elegeu-se e pôde, mais uma vez, governar a favor do progresso. Criou a Petrobrás, instituiu a SUMOC (precursora do Banco Central), debelou o desequilíbrio cambial através da Instrução 70, limitou a 10% as remessas de lucros das empresas estrangeiras, e aumentou em 100% o salário mínimo. Tudo isso exaspera a direita, desatina as classes patronais, enfurece o imperialismo e enlouquece os militares golpistas. Estes soltam o hidrofóbico Carlos Lacerda, que dá continuidade a uma campanha difamatória contra o governo de Getúlio. Ocorre, naquele torvelinho, o atentado contra Carlos Lacerda em quemorre o major da aeronáutica Rubens Vaz. Embora Getúlio nada tenha tido a ver com esse fato e a polícia tenha rapidamente elucidado o crime e prendido os culpados, os ataque a ele e o clima golpista se acirram cada vez mais. Pressionado a renunciar, Getúlio prefere o suicídio, em 24 de agosto de 1954, causando, assim, grande comoção nacional e profunda consternação no seio do povo. O movimento que articulava a deposição do presidente foi, de um dia para o outro, abafado por um sentimento geral antigolpista e getulista. O suicídio de Vargas atrasou em dez anos a tomada do poder tramada pela direita.

Novo golpe de Estado foi tentado contra a posse dos novos presidente e vice-presidente eleitos: Juscelino Kubitschek e João Goulart. O êxito dessa conspiração foi evitado pela decisiva intervenção do Ministro da Guerra, o general legalista Henrique Lott. Juscelino fez um governo de conciliação nacional e grande prosperidade. Estimulou o investimento estrangeiro, que resultou no desabrochar da indústria automobilística brasileira, construiu Brasília e obteve um elevado ritmo de crescimento econômico. Realizou ou iniciou grandes obras, como as barragens e usinas hidrelétricas de Furnas e de Três Marias e a estrada Belém-Brasília. No entanto, foi também odiado pela direita furibunda que sentia falta da repressão às lutas populares e sentia-se sufocada no clima de liberdade existente.

Duas revoltas ocorreram durante esse período – a de Jacareacanga, em 1956, e a de Aragarças, em 1959. Na primeira, dias depois da posse de Juscelino, dois majores da Aeronáutica desertaram, roubaram um avião e tomaram a localidade de Jacareacanga, no sul do Pará. A rebelião foi debelada em alguns dias, seu principal chefe foi preso e os demais fugiram para a Bolívia. Pouco depois, foram todos anistiados por Juscelino e reintegrados ao serviço ativo, sem sofrerem nenhuma execração raivosa por parte deseus colegas direitistas, bem ao contrário do que ocorreu anos mais tarde com o capitão Lamarca. Na segunda, Haroldo Veloso, o líder da primeira, já tenente-coronel, desertou juntamente com o tenente-coronel João Paulo Burnier e outros oficiais. Eles furtaram três aviões da aeronáutica e tomaram à força um avião da Panair, que se constituiu no primeiro sequestro de avião ocorrido no Brasil. Depois ocuparam a localidade de Aragarças, em Goiás. A revolta durou 36 horas. Seus líderes fugiram nos aviões para o Paraguai, Bolívia e Argentina. Posteriormente, foram todos anistiados e reintegrados a suas carreiras.

Findo o Governo de Juscelino, as forças populares e nacionalistas, juntamente com socialistas e comunistas, apresentaram as candidaturas de Lott, para presidência, e de João Goulart – o Jango –, para a vice-presidência. Lott, general legalista, cumpridor dos regulamentos, introdutor no Exército da promoção exclusivamente por mérito segundo a folha de serviço, católico praticante e nacionalista, era um homem honrado. Era incapaz de perseguir qualquer de seus inimigos, de direita ou de esquerda. Durante todo o tempo em que foi Ministro da Guerra, nunca promoveu nenhum de seus filhos ou genros que seguiam a carreira militar, mesmo que estes estivessem na vez. Como não fazia promessas, nem se comprometia a distribuir nem cargos nem verbas em troca de apoio, foi aos poucos sendo abandonado por aqueles políticos clientelistas que povoam os partidos brasileiros e controlam os currais eleitorais. Adstrito apenas ao eleitorado consciente, Lott foi derrotado pelo candidato da UDN, Jânio Quadros. Este era um político demagogo e histriônico que ganhou fama de varredor do serviço público. Pode-se traçar um paralelo entre ele e o Collor, muitos anos mais tarde – o Caçador de Marajás. É incrível como a História se repete. A direita, na impossibilidade de usar a submissão aos interesses do capitalismo e do imperialismo como argumento, levanta sempre o fantasma da corrupção, que tenta imputar aos governos que lhe caem em desgraça.

Já que, naquele tempo, as eleições para presidente e para vice-presidente eram desvinculadas, Jango, que tinha sido Ministro do Trabalho de Getúlio e possuía forte apoio no movimento sindical, foi eleito para vice. Da mesma forma que Collor, Jânio não conseguiu terminar o mandato. Logo no primeiro ano, tentou dar um golpe que lhe saiu pela culatra. Renunciou para tentar voltar mais forte, mas seu ato foi aceito sem maiores problemas. Ou com apenas um problema. O vice era o Jango, inaceitável para a direita reacionária. Tentaram impedir a sua posse, aproveitaram-se de que ele estava em viagem pelo mundo e se encontrava na China quando se deu a renúncia. Nesse momento, entrou em ação Leonel Brizola, governador do Rio Grande do Sul. Brizola era o homem que havia tido a coragem de encampar a empresa de força e luz de Porto Alegre, subsidiária da Bond & Share, dos Estados Unidos, pagando segundo seu valor histórico, como mais tarde fez com subsidiária da ITT que detinha o controle da telefonia. Depois do golpe militar de 1964, ambas as empresas foram milionariamente indenizadas pelo governo de Castelo Branco. Na crise da posse de Jango, Brizola, orientado por Lott, entrou em contato com o General Machado Lopes e ambos resolveram resistir e garantir o cumprimento da Constituição. Criou-se, no rádio, a Cadeia da Legalidade. Jango desembarcou em Porto Alegre. Constituído o impasse e iminente a guerra civil, fez-se um acordo: Jango tomaria posse, mas o regime mudaria do presidencialismo para o parlamentarismo. O Brasil teve três primeiros ministros, enquanto Jango foi presidente parlamentarista. Depois, realizou-se um plebiscito que decidiu o retorno ao presidencialismo.

Jango caracterizou-se por preconizar as Reformas de Base: agrária, educacional, fiscal, administrativa, bancária e urbana. Instituiu o 13º salário, nacionalizou as telecomunicações e criou a Embratel e fundou a Eletrobrás. Autorizou a Petrobrás a entrar no mercado nacional de distribuição de derivados do petróleo, antes restrito às empresas estrangeiras.

Lançou uma Campanha Nacional de Alfabetização, baseada no método criado por Paulo Freire, com o objetivo de erradicar o analfabetismo no Brasil. Esse Governo progressista, nacionalista e de elevada preocupação social, despertou a ira da direita raivosa e do capitalismo internacional. Essas forças retrógradas aproveitaram o clima de rebeldia existente no meio dos sargentos e marinheiros para acirrar a reação da oficialidade ao “clima de indisciplina” e conseguir a adesão de setores vacilantes das forças armadas.

Com o apoio decisivo dos serviços de inteligência dos Estados Unidos, levaram a cabo o golpe de Estado que foi, ironicamente, apelidado, pelo inesquecível humorista Sérgio Porto, de “Revolução Redentora”.

Iniciou-se um trágico período da História do Brasil.


PUXADINHO DO JADER 

 
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Urariano Mota: a história viva dos anos da ditadura

O livro “68 a geração que queria mudar o mundo” é um calhamaço de 690 páginas que, em vez de assustar pelo peso e volume, deixa em toda a gente um fascínio. Explico, ou tento explicar. De agora em diante, ele será um volume de consulta obrigatória, para que não se cometam mais tantos atentados à história e à verossimilhança em telenovelas, peças e filmes no Brasil, quando o assunto for ditadura.
Por Urariano Mota

Organizado por Eliete Ferrer, editado pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, no livro participam 100 autores em 170 relatos. Em mensagem coletiva no grupo da internet “os amigos de 68”, Eliete informa que nele se encontram “histórias reais ocorridas desde 1964 até a abertura política - nas reuniões, na militância, nas manifestações, nas discussões, na prisão, nas ações armadas ou não, nos treinamentos, na clandestinidade, no Brasil ou no exterior, no exílio. O diferencial do nosso livro caracteriza-se pela revelação do lado humano e afetivo daqueles que não aceitaram a prepotência do Golpe de 64, concebido e engendrado nos Estados Unidos”.

De fato, se em alguns relatos individuais as angústias e o heroísmo de militantes socialistas nem sempre se acham realçados, na maioria dos textos e no seu quadro geral se depreende uma história rica da vida de jovens, de homens e mulheres na última ditadura, que, setores à direita queiram ou não, está na agenda do mundo político do Brasil. O livro vem numa luta que exige resposta da civilização brasileira aos assassinatos até hoje encobertos. Mais precisamente, na batalha incansável dos familiares dos mortos que continuam a busca dos corpos dos filhos, pais e irmãos. “68 a geração que queria mudar o mundo” é parte ativa da consciência do país que deseja uma punição exemplar para crimes contra a humanidade, que são imprescritíveis por todas as convenções internacionais do Direito.

O melhor e mais agradável em “68 a geração que queria mudar o mundo” é que ele não é um volume de teses. Em seu conjunto lêem-se relatos plenos de frescor, isso quer dizer, de sangue vivo, da hora, recuperado com o frescor da memória. É um livro necessário, porque nele estão as chamadas fontes primárias, as pessoas fora dos arquivos, contando o que viveram, penaram ou mesmo imaginaram nos anos do terror da ditadura brasileira. Delas vêm os documentos primários da luta dos malditos anos. É um livro urgente, para ser lido e divulgado.

Nele hão de se debruçar historiadores, roteiristas, cineastas, teatrólogos e jovens de todo o gênero e escolas para que compreendam o mundo que ainda lhes é desconhecido, de pessoas iguais a eles, que viveram, morreram ou escaparam por um triz, em situação-limite. São relatos da vida clandestina, de acontecimentos inimagináveis de “expropriações revolucionárias”, ou como a repressão as chamava, de assaltos a bancos por terroristas. Histórias de treinamento de guerrilha no Brasil, um documento vivo e inédito, e de amor, do amor que sobrevivia entre as porradas e tensões.

O curioso, para muitos, é que nele há também lugar para o humor, pois que os tempos eram duríssimos, mas os homens além do terror e crimes sofridos, também possuíam ou procuravam motivos para rir. Como neste caso, digno de Stanislaw Ponte Preta, o grande humorista que desmontou o ridículo da ditadura brasileira. Copio trecho do depoimento de Emílio Myra e Lopez:

“Um colega seu de ofício (do advogado Lino Ventura) defendia uma mulher e durante o seu processo ocorre o fato, verídico e registrado em seus autos. O advogado de sua defesa inquire o sargento, sua testemunha de acusação.

- Senhor sargento, por que o senhor acusa minha cliente de ser subversiva?

- Pelo material apreendido em sua casa – responde.

- Mas, especificamente, que material?

- Umas cartas...

O advogado prossegue.

- Sargento, seriam estas castas, às quais se refere?

- Sim, senhor, são estas cartas.

- Mas sargento, estas cartas estão escritas em idioma francês, o senhor tem conhecimento do idioma francês?

- Não senhor – responde o sargento para espanto e risos no plenário.

Insiste o advogado.

- Senhor sargento, se o senhor não conhece o idioma francês, como pode, por estas cartas, acusar minha cliente de ser subversiva?

- Mas é claro – prossegue convicto o sargento – eu li nas entrelinhas”.

Há outros, muitos outras histórias, casos, depoimentos, poemas, entre o drama, o trágico e a comédia. Há pelo menos 169 outros relatos. Mas tenham pena deste digitador. Leiam o livro.
 
 

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