quarta-feira, 16 de março de 2011

Gay é pai das denúncias do WikiLeaks

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Bradley ManningTodo mundo sabe quem é o australiano Julian Assange, o criador do WikiLeaks, mas poucos sabem quem é o americano Bradley Manning. Aos 22 anos, Manning foi enviado para o Iraque como soldado especializado em informática. Era atípico: tem 1,57m e pesava 47 quilos. Gay assumido, foi expulso de casa pelo pai e, para sobreviver, decidiu entrar para o Exército. “Ele estava lá por seu talento para manipular computadores. Na função de analista de inteligência, Manning passava longos dias na sala de informática da base [militar], examinando cuidadosamente informações confidenciais”, contam os repórteres David Leigh e Luke Harding, do The Guardian. “Ele ficara impressionado com a falta de segurança. A porta era trancada com uma fechadura de código de cinco dígitos, mas bastava dar um empurrão e era possível entrar.”
Na base militar, as coisas não funcionavam como tradicionalmente se pensa sobre o establishment americano. Manning escreveu: “Servidores ruins, registros ruins, segurança física ruim, contrainteligência ruim, análise de sinal negligente... Uma perfeita tempestade”. A negligência “alimentava oportunidades”. Para o soldado, “essas oportunidades se apresentaram sob forma de dois laptops militares, cada um deles com acesso privilegiado a segredos de Estado norte-americanos. (...) Espanta o fato de que um soldado raso pudesse ter acesso aparentemente irrestrito a essa enorme fonte de material confidencial. E que pudesse fazê-lo praticamente sem supervisão ou salvaguardas, no interior da base, é mais impressionante ainda. Ele passava horas examinando documentos e vídeos altamente confidenciais, usando fones de ouvido e fingindo cantar Lady Gaga. Quanto mais lia, mais alarmado e perturbado ficava, chocado com o que considerava duplicidade e corrupção oficiais do próprio país. Tratava-se de vídeos que mostravam o ataque aéreo de um helicóptero equipado com metralhadoras a civis desarmados no Iraque, relatos de mortes de civis e acidentes causados por ‘fogo amigo’ no Afeganistão. E havia uma quantidade gigantesca de telegramas diplomáticos revelando segredos de todo o mundo, do Vaticano ao Paquistão”.
Espantado com o material, assim como é espantoso que tenha sido permitido seu acesso às informações, Manning pegou seu CD regravável com as músicas de Lady Gaga, apagou-as e copiou os documentos. Homem de “elevada integridade moral”, segundo David House, aluno da Universidade de Boston, por que Manning decidiu arriscar e entregar o material para Julian Assange, do WikiLeaks? O jovem, impetuoso, “acreditava que o valor da informação livre para a sociedade democrática” é fundamental.
Na Estação Operacional de Contingências Hammer, no Iraque, Manning ficou profundamente irritado com um fato e isto fez com decidisse agir. Quinze iraquianos foram presos porque supostamente divulgaram “literatura anti-iraquiana”. Ao receber a tradução do material, Manning ficou estupefato: “Na verdade, era uma crítica acadêmica ao primeiro-ministro iraquiano, Nouri al-Maliki, que associava a corrupção dominante ao gabinete do político”. A versão do próprio Manning: “Imediatamente peguei aquela informação e fui até o oficial explicar o que estava acontecendo. Mas ele não quis me ouvir [...]. Disse para eu calar a boca e explicar como poderíamos ajudar a polícia [iraquiana] a arranjar mais detidos”.
Ao ser advertido pelo superior, o mundo de Manning começou, de certo ponto de vista, a “desmoronar” (de outro, pode ter sido um renascimento). “Comecei a ver tudo de modo distinto [...]. Sempre questionei o modo como as coisas funcionavam e investiguei para descobrir a verdade [...] mas, dessa vez, era uma questão na qual eu tomava parte e estava ativamente envolvido, sendo radicalmente contra.”
Os repórteres do “The Guardian” contam que Manning “começou a pensar em explorar as bases de dados secretas às quais tinha acesso e lançá-las de modo espetacular ao domínio público”. Manning frisou: “É importante que isso seja conhecido [...] Por alguma razão estranha, acho que isso pode realmente mudar as coisas”.
Manning foi atraído pelo WikiLeaks porque, em 2009, acompanhou a publicação de mais “de quinhentas mil mensagens de pagers, interceptadas no dia dos ataques de 11 de setembro de 2001 em Nova York e Washington, na ordem em que haviam sido enviadas. Elas ofereciam uma imagem extraordinária de um dia extraordinário. Manning ficou ainda mais impressionado porque, com seu conhecimento, sabia que o WikiLeaks conseguira as mensagens anonimamente de uma base de dados da Agência de Segurança Nacional. E isso fez com ele se sentisse à vontade para oferecer o material ao WikiLeaks, sem medo de ser identificado. A busca por um canal através do qual descarregar a montanha de material confidencial foi bem-sucedida. Poucos dias depois do impressionante WikiLeaks 11/9, Manning deu o primeiro grande passo. Fez contato com um homem que descreveu como ‘um australiano maluco de cabelo branco que não parece conseguir ficar no mesmo país por muito tempo’. Agora, a bola estava com Julian Assange”. Manning forneceu a Assange todos os 250 mil telegramas encontrados na base de dados “Net-Centric Diplomacy”.
Deprimido, tomando uma série de medicamentos, e abandonado pelo namorado, Manning fez confidências a Adrian Lamo, hacker norte-americano, que o denunciou ao governo. Manning “está preso na Base dos Fuzileiros Navais em Quântico, na Virgínia. Embora não tenha sido julgado ou condenado, está vivendo sob condições difíceis. Passa 23 horas por dia sozinho numa cela de 1,8 por 3,5 metros, com uma hora de exercício, na qual caminha fazendo o número oito num cômodo vazio. Segundo seu advogado, Manning não pode dormir depois que acorda, às cinco horas da manhã. Quando tenta fazer isso, os guardas — que não podem conversar com ele — imediatamente mandam que se sente ou fique de pé. Qualquer tentativa de fazer flexões ou outros exercícios na cela é impedida pelo uso da força”.
No fim de 2010, Manning estava lendo “Crítica da Razão Pura”, de Kant. Detalhe: Manning divulgou os documentos e não recebeu um centavo. Não ficou nem mesmo com a fama — toda de Julian Assange, o garanhão australiano, acusado de “estuprar” duas suecas. Na verdade, fez sexo com as duas sem usar camisinha — o que é crime na Suécia. Elas queriam manter relações sexuais com o criador do WikiLeaks, sobretudo porque estavam impressionadas com seu trabalho, mas não à força, e sem camisinha. Assange não tem o hábito de respeitar mulheres, contam os jornalistas do “The Guardian”. Mesmo com as acusações, Assange está consagrado — vai virar filme e está escrevendo memórias muito bem pagas. Já o gay gentil e sensível Manning pena numa prisão. 

WikiLeaks melhorou imagem dos Estados Unidos
WikiLeaks — A Guerra de Julian Assange Contra os Segredos de EstadoCauteloso. É o mínimo que se pode dizer do livro “WikiLeaks — A Guerra de Julian Assange Contra os Segredos de Estado” (Verus, 336 páginas, tradução de Ana Resende), dos jornalistas ingleses David Leigh, editor investigativo do “The Guardian”, e Luke Harding, correspondente do “The Guardian” em Moscou. Eles sabem muito sobre Julian Assange, o australiano criador do WikiLeaks, o mais famoso site de vazamento de documentos confidenciais do mundo. Mas revelam pouco, talvez porque Assange mistura verdade e mentira a rodo, criando um mito que ninguém pôde desnudar (como hacker, usava o pseudônimo de Mendax — “dado a mentiras”). Sobre suas fontes de financiamento, que ninguém sabe exatamente quais são, Leigh e Harding são parcimoniosos — vendendo a versão do próprio Assange. No capítulo “Julian Assange”, em 15 páginas, resumem sua biografia. De hacker, com aprendizado de autodidata, saltou para a criação do site de vazamento de informações privilegiadas de vários governos. Seu lema é: “Para o homem fazer algo inteligente, ele tem de saber o que realmente está acontecendo”. Ao jornalista Daniel Ellsberg, que atraiu para sua causa, frisou: “Incentivar um movimento mundial de vazamentos em massa é a intervenção política mais efetiva em termos de custo”.
Um dos capítulos mais instigantes do livro de Leigh e Harding é o último, “O futuro do WikiLeaks”. “Graças a publicidade global gerada pela parceria com os jornais [“The Guardian”, “El País” e “New York Times”], o WikiLeaks recebeu a impressionante soma de 1 milhão de euros em doações no ano de 2010”, revela a dupla. Assange não teria recebido outros fundos, talvez secretos? Os jornalistas britânicos contentam-se com a informação oficial da Fundação Wau Holland, “o principal braço financeiro do” site. As memórias de Assange, que devem ser publicadas em abril deste ano, vão lhe render 1,6 milhão de dólares. O título está definido: “WikiLeaks Contra o Mundo: Minha História”. “Ele recebeu imediatamente mais de 250 mil libras de adiantamento, embora uma quantia de seis dígitos tenha sido reservada para contratar um ghost-writer.” Uma estocada sutil: Assange, embora seja inteligente, não sabe escrever? O diretor de “O Ultimato Bourne”, Paul Greengrass, deve dirigir um filme sobre o vazador-mor de documentos sigilosos.
A informação mais interessante do livro, publicada nas páginas 246, 247 e 249, mostra que os Estados Unidos estão menos descontentes com o WikiLeaks do que imagina nossa vã filosofia. Depois da fúria inicial, “os oficiais do Departamento de Estado parecem ter concluído que os controversos vazamentos divulgados pelo site causaram poucos danos reais e duradouros à diplomacia norte-americana” (uma mente conspiratória de esquerda vai acabar dizendo que, longe de ser perseguido pela CIA, Assange é um de seus agentes. Uma mente conspiratória de direita certamente terá condições de sugerir que o australiano é agente da polícia política da Rússia, a FSB, antiga KGB). Informes privados do Congresso americano indicam que “diplomatas americanos de alto escalão admitiram que os efeitos colaterais da divulgação de milhares de telegramas diplomáticos privados em todo o mundo não foram particularmente ruins. Um funcionário do Congresso disse à Reuters que o governo se sentia forçado a dizer publicamente que as revelações haviam prejudicado os interesses norte-americanos para apoiar os esforços em bloquear o site do WikiLeaks e acusar criminalmente os informantes”.
Os publicitários certamente dirão que Assange constituiu com o WikiLeaks uma marca mundial, como a Coca-Cola. O ciberanalista Evgeny Morozov, da Universidade de Stanford, diz que o WikiLeaks “tornou-se uma imensa marca global”. Morozov afirma que o site tem duas grandes vantagens sobre os imitadores: “Uma marca ampla e facilmente reconhecida e uma enorme rede de contatos nos meios de comunicação”. O site criado por Assange pode “‘se transformar num gigantesco intermediário de mídia’, uma central de troca de informações jornalísticas”.
Ian Katz, editor-assistente do “The Guardian”, avalia que Assange “usou seu perfil de maneira muito inteligente, e o que ele está tentando fazer é se tornar a marca, por assim dizer, sinônimo de vazamentos”. Katz sugere que a marca que os jornais ajudaram a criar pode substitui-los. No lugar de procurá-los, as fontes podem enviar o material direto para o site ou outros sites semelhantes, como IndoLeaks, BrusselsLeaks, BalkanLeaks, ThaiLeaks, PinoyLeaks. “A ideia de Assange, de um site para ativistas vazarem informações anonimamente”, parece “ter-se tornado viral”, destacam Leigh e Harding.
O governo corrupto do presidente da Tunísia, Zine El Abidine Ben Ali, não caiu por conta dos vazamentos dos documentos da diplomacia americana. Mas, como escreveu um jovem tunisiano, no site “Comment is Free”, do “The Guardian”, “o  WikiLeaks revela o que todos estavam cochichando”. Noutras palavras, deu o empurrãozinho que faltava. “Paradoxalmente, os comentários vazados do embaixador norte-americano na Tunísia, amplamente lidos em toda a região, desempenharam um importante papel na difusão da imagem de Washington pelas ruas árabes. Tunisianos comuns gostaram do jeito como os norte-americanos — diferentemente dos franceses — destacaram de modo tão sincero a corrupção. Agora eles queriam que os Estados Unidos apoiassem a Revolução de Jasmin em curso. E pediram a Washington que pressionasse os líderes árabes vizinhos e evitassem sua interferência”, escrevem Leigh e Harding. “O vazamento ajudava agora a reparar a reputação desgastada do Estados Unidos no Oriente Médio, prejudicada pela Guerra do Iraque, e a promover os grandiosos objetivos da Casa Branca de democratização e modernização. Assange poderia considerar os Estados Unidos seu inimigo, mas, nesse caso, ele involuntariamente ajudara a restaurar a influência norte-americana num lugar onde o país havia perdido a credibilidade. Era irônico. Ao aumentar a quantidade de informação no sistema, o WikiLeaks gerou efeitos imprevisíveis.” Estranhamente, os autores não citam o Twitter e o Facebook como fatores de arregimentação popular, sobretudo dos jovens. A omissão talvez tenha a ver com a supervalorização do WikiLeaks.
Leigh e Harding notam que o líder da Líbia, Muammar Kadafi, percebeu rápido que a internet é um instrumento de mobilização quase incontrolável. Só não quis perceber que seu governo ditatorial estava/está no fim.
Numa entrevista ao jornal “O Globo” (sábado, 26), Leigh diz que Assange “é um expert em computação e um jornalista amador” e que age, às vezes, “de forma irresponsável”. O que o WikiLeaks nos ensinou? O editor do “The Guardian” oferece uma resposta: “O que aprendemos é que a tecnologia da internet se desenvolveu a tal ponto que gigantescos bancos de dados estão sendo criados, com uma quantidade de informação sem precedentes. Isso facilita vazamentos. Para os jornalistas, é importante aprender a lidar com esses grandes bancos de dados e extrair deles informações úteis. Julian foi pioneiro nisso, e é algo que todos teremos que aprender a fazer”.
No apêndice, com tradução de Marcos Malvezzi Leal, os autores transcrevem telegramas diplomáticos americanos. O “The Guardian” possibilita acesso a todos os telegramas no site www.guardian.co.uk/wikileakscablesdatabase. A Editora Campus/Elsevier lança “Os Bastidores do WikiLeaks”, do alemão Daniel Domscheit-Berg, ex-porta-voz de Assange.

Buscado no BULA REVISTA
Puxadinho 
Só falta dizer que ele batia sistematicamente nos pais e sequestrou adão e eva

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