terça-feira, 7 de setembro de 2010

GRITO DOS EXCLUÍDOS (Elementos de Reflexão)

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O Grito dos Excluídos não é um evento localizado no tempo e no espaço. Trata-se, antes, de um conjunto de atividades que convergem para uma determinada data de mobilização geral: o chamado "dia do Grito". Este, no Brasil, ocorre a 7 de setembro; na América Latina, a 12 de outubro. Uma série de manifestações precedem ou dão continuidade a esse dia, no sentido de priorizar não apenas o conteúdo do evento, mas sobretudo o processo e a medodologia de preparação e participação.
No Brasil, o Grito dos Excluídos tem início em 1995. Na América Latina, pela primeira vez, em 1999. Depois de cinco anos de história, podemos apontar algumas constantes ou aquisições de fundo, as quais têm estado presentes em sua elaboração e organização.
A primeira, é a constatação de que grande parte da população brasileira, e de todos os países do continente latino-americano, vem sendo cada vez mais excluída dos benefícios do desenvolvimento tecnológico e econômico.
Essa exclusão cresce e se aprofunda de ano para ano, negando à maioria do povo os direitos fundamentais à vida, ou seja, o direito a uma real e justa cidadania. É o que tem sido chamado de "apartheid social".
Diante dessa exclusão, o Grito faz a denúncia do modelo neoliberal globalizado e do sistema financeiro internacional, cujo único interesse é maximizar os lucros, esquecendo a situação de fome e miséria de milhões de pessoas espalhadas por todo o planeta, especialmente no Terceiro Mundo. A denúncia atinge igualmente as elites nacionais, as quais, por se beneficiar do status quo, subordinam a economia e a política aos credores internacionais (FMI, Banco Mundial e outros), comprometendo inclusive a soberania nacional, sem qualquer atenção às reais necessidades dos países.
Mas a denúncia não basta. Ela é seguida de um anúncio explícito, o qual, consciente de que esse modelo econômico é insustentável, luta por uma nova sociedade em que a política e a economia estejam submetidas a imperativos éticos. Estes devem ter a preocupação de priorizar uma reforma agrária e agrícola eficaz, a educação, a saúde, a moradia, o trabalho e o salário justo para todos, a defesa das terras indígenas, o incentivo à produção familiar e comunitária, a garantia das leis trabalhistas, o respeito ao meio ambiente, o lazer - enfim, uma sociedade onde todos se sintam devidamente integrados como verdadeiros cidadãos.
Para isso, é necessário uma parceria ampla e plural de todas as forças vivas da sociedade, num esforço que vai desde elaboração e a preparação do Grito dos Excluídos até a participação no mesmo. No fundo, trata-se de um evento construído num grande "mutirão", nacional e continental, onde todos são chamados ao protesto e à luta.
Essa parceria procura não excluir nenhum dos atores interessados na transformação efetiva da sociedade.
Chega-se, assim, ao Grito propriamente dito. O que é? Antes de tudo, uma dor secular e sufocada que se levanta do chão. Dor que se transforma em protesto, cria asas e se lança no ar. De ponta a ponta do país ou do continente, o povo solta ao vento o seu clamor, longamente silencioso e silenciado. É um grito que ganha os ares, entra pelas portas e janelas, toma os espaços. Tem como objetivo unificar todos os gritos presos em milhões de gargantas, desinstalar os acomodados, ferir os ouvidos dos responsáveis pela exclusão e conclamar todos à organização e à luta. É o grito dos empobrecidos, dos indefesos, dos pequenos, dos sem vez e sem voz, dos enfraquecidos - numa palavra, o grito dos excluídos!
O Grito aponta os erros e os crimes desse modelo excludente, sem dúvida, mas ele quer ser propositvo. Trata-se de buscar formas concretas de ação popular, no sentido de contribuir para a transformação da sociedade, de construir um desenvolvimento econômico participativo e sustentável, respeitando a vida e a natureza. Aqui é preciso apoiar as iniciativas populares, respeitar as diferenças de soluções abertas e plurais, fortalecer as organizações de base e as mais variadas formas de luta. Lembrar, antes de mais nada, que os povos latino-americanos têm em sua história uma imensa fonte de resistência, uma memória viva, criativa e ativa na busca de novas alternativas.
Por fim, mas não em último lugar, procura-se garantir o protagonismo dos excluídos. A partir das bases, eles são chamados a participar ativamente da preparação das atividades em torno do Grito. Além disso, são eles os "donos da palavra". Assim, no dia do Grito, os microfones não são loteados pelas entidades de apoio, nem por lideranças sindicais ou políticas. Elas são sempre bem vindas, é claro, mas como retaguarda e garantia à voz dos excluídos. A palavra e o grito permanecem abertos aos interesses reais dos próprios excluídos.
O Grito, em seus primeiros cinco anos, sinaliza para uma nova forma de organização dos excluídos.
Caracteriza-se pelo envolvimento dos mesmos ao longo de todo o processo, seja na produção do conhecimento relativo à exclusão social, seja nas formas de organização e de mobilização. É importante destacar a criatividade dos grupos diante das situações de exclusão. Vale destacar, como exemplos, a participação em desfiles oficiais, o envolvimento das escolas, vigílias e alvoradas na véspera do Grito, etc.
Do ponto de vista da organização, é importante lembrar que, embora exista uma coordenação nacional, são respeitadas e estimuladas muitas outras formas de organização: coordenações locais, regionais e estaduais. Não se trata de criar novas estruturas. Na verdade, o Grito aproveita as que já existem, ligadas às entidades envolvidas, tais como, Igrejas, centrais sindicais, movimentos populares, associações. Apesar de contar inicialmente com os recursos das pastorais sociais, hoje vão se consolidando novas fontes de recursos: venda de material, contribuições eventuais e uma quota anual para cada uma das organizações promotoras.
Como se faz a divulgação do Grito? Em primeiro lugar, através de publicações próprias: um tablóide periódico, com uma tiragem de aproximadamente 60 mil números; um boletim temático e um cartaz, o qual é produzido de forma coletiva. Em segundo lugar, vem a colaboração de vários parceiros: rádios comunitárias, rádios dos sindicatos, pastorais e igrejas, além dos mais variados boletins de cada uma das entidades envolvidas.
Em 1995, o Grito contava com uma rede de 60 articuladores, a nível nacional. Hoje, após cinco anos de experiência, esse número já chega à casa dos mil, representando todos os estados da federação e as mais diversas entidades (Igrejas, sindicatos, movimentos populares, federações, e organizações de base). Na reunião realizada no final do mês de julho, determinou-se um ponto de referência em cada estado, o qual deverá centralizar as informações e remetê-las à sede nacional do Grito. Desta forma, pretende-se que as informações veiculadas logo após a realização do Grito sejam o mais próximo possível da realidade, como uma das formas de fazer frente à grande imprensa, que em geral procura distorcer ou minimizar a repercussão do evento. As distorções ocorrem sobretudo em relação ao número de cidades e de pessoas que efetivamente participam das manifestações de rua.
A continuar o crescimento, como de fato tem acontecido no Brasil e, a partir deste ano, na América Latina, a perspectiva é de que no próximo ano tenhamos um Grito Continental, rumo a uma grande manifestação mundial dos excluídos.
Pe. Luiz Bassegio e Pe. Alfredo Gonçalves,
Pela Coordenação do Grito dos Excluídos no Brasil.

Copiado do blog Gilson Sampaio





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