domingo, 14 de abril de 2013

Cora Coralina em Prosa



Buscado no Chá.com Letras

 

 

Por: Leila Brito



259323721_27e77bb8fb
Minga, zóio de prata

CORA CORALINA
Eram elas as senhoras-donas, ali no beco do Calabrote.
Quem transitasse pelo beco, tivesse cuidado… Passasse quieto e bonzinho. Não se engraçasse nem fizesse cara de pouco. E quem fosse de entrar, empurrasse a porta de dentro, com fala curta e dinheiro pronto. Escândalo de mulher-dama não dava; nunca deu; também, nunca foram levadas, como tantas, para capinar na frente da cadeia. Família de respeito podia passar toda hora, não via nada. Macho, porém, que não se fizesse de besta… Eram donas e autoridade no beco. O beco era delas. E tinham prestígio.
Duas irmãs, morando juntas na mesma casa, de porta e janela aberta aos homens que quisessem entrar; isso a Zóio de Prata. Já a Dondoca, tinha seu homem e era pontual a ele só.
Também eram conhecidas por As Cômodas, na roda da macheza. Minga era durona. Não tretasse com ela, saindo sem deixar a taxa… Um que tentou a rasteira, ela alcançou já fora do beco e deixou sem as calças no meio da rua.
Tinha mesmo um bugalho branco, saltado, e era vesga do outro. Espinhenta, de cabelo sarará, mulatona encorpada, de bacia estreita, peito masculino, de mamilos duros, musculosa; servindo bem no ofício, de fala curta, braço forte, mãos grandes.
Um dia, voltava ela do mercado com um frango na mão, deu de cara com a irmã chorando, de cara amassada e beiço partido. Tinha entrado na peia do amigo — o Izé da Bina — à-toa, ruindade de pingado ordinário. Dei’stá — disse ela — sai fora e deixa por minha conta. Óia, vai depená esse frango pra nóis na casa da vizinha e só entra quando eu chamá…
Dondoca foi fazer o mandado. Estava ela na casa da vizinha depenando o frango, quando chegou o Izé da Bina, todo mandante, de paletó preto, gravata borboleta, calça engomada.
Entrou no quarto e gritou autoritário pela Dondoca. Quem apareceu foi a Zóio de Prata, de manga arregaçada e porrete na mão. Atirou-se no mulato com vontade e foi porretada de direita e canhota. Bateu com sustância, sovou com fôlego, quebrou as carnes, moeu bem moído. No fim, jogou fora o cacete e entrou de corpo. Numa boa sobarbada deu com o crioulo no chão. Sentou em cima e esmurrou à vontade. Quebrou as ventas, partiu dois dentes, entrou no olho… xingou nomes… desses de ouvindo dizer o Antônio Meiaquarta, tipo de rua, rei dos bocas-sujas da cidade: eu sei dois contos e quinhentos de nomes indecentes… Zóio de Prata sabe cinco contos… apanhei dela, bateu em mim… tou descarado, apanhei dela… muié praceada… êta muié sagais.
Depois de ver o cabra mole, estirado, fungando, Zóio de Prata assungou a saia, abriu as pernas e mijou na cara de Izé da Bina.
Estava vingada a Dondoca e consolidada a fama das Cômodas.

Referência:

CORALINA, Cora. Estórias da Casa Velha da Ponte. São Paulo: Global Editora, 1988, p. 13.
Ilustração:
Beco de favela. Foto de autor desconhecido. Disponível em: .

 .




 

 

Vídeo em Destaque [Cora Coralina]

 

|Por: Leila Brito - Chá.com Letras



cora-coralina-4
Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas


Filha de Francisco Paula Lins Guimarães Peixoto, desembargador nomeado por D. Pedro II, e de Jacinta Luísa do Couto Brandão, nasceu Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas, na cidade de Goiás, em 20 de agosto de 1889, às margens do rio Vermelho, em casa comprada por sua família no século XIX, quando seu avô ainda era uma criança, onde foi criada. Estima-se que essa casa foi construída em meados do século XVIII, tendo sido uma das primeiras edificações da antiga Vila Boa de Goiás.
Depois de cursar somente as primeiras quatro séries, com a Mestra Silvina, ou Mestre-Escola Silvina Ermelinda Xavier de Brito (1835 – 1920), começou a escrever os seus primeiros textos aos 14 anos de idade, publicando-os nos jornais da cidade de Goiás, e nos jornais de outras cidades, como o semanário “Folha do Sul” da cidade Goiana de Bela Vista – desde 20 de janeiro de 1905, e a revista A Informação Goiana do Rio de Janeiro, editada a partir de 15 de julho de 1917.

cora-coralina-na-juventude
A jovem Anna

Conforme atesta Assis Brasil, na sua antologia “A Poesia Goiana no Século XX” (Rio de Janeiro: IMAGO Editora, 1997, p. 66), “a mais recuada indicação que se tem de sua vida literária data de 1907, através do semanário ‘A Rosa’, dirigido por ela própria e mais Leodegária de Jesus, Rosa Godinho e Alice Santana.” Todavia tem-se trabalhos seus publicados em periódicos goianos antes dessa data. É o caso da crônica “A Tua Volta”, dedicada a ‘Luiz do Couto, o querido poeta gentil das mulheres goyanas’, estampada semanário “Folha do Sul”, da cidade de Bela Vista (Folha do Sul, ano 2, n. 64, p. 1, 10 de maio de 1906).
Por ocasião dessa publicação, ou pouco antes, Cora Coralina começa a frequentar as tertúlias do “Clube Literário Goiano”, situado em um dos salões do sobrado de dona Virgínia da Luz Vieira, que lhe inspira o poema evocativo “Velho Sobrado”. Nessa época, começa a escrever para o jornal literário “A Rosa” (1907), fase em que publica, em 1910, o conto Tragédia na Roça.

A_poetisa_e_contista_Anna_Lins_dos_Guimar_es_Peixoto_Bretas_a_Cora_Coralina_entre_os_frequentadores_do_Gabinete_Liter_rio_Goiano


A poeta e contista Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas
entre os frequentadores do Gabinete Literário Goiano
Em 1910, casa-se com o advogado Cantídio Tolentino de Figueiredo Bretas, com quem se mudou, no ano seguinte, para o interior de São Paulo, onde viveu durante 45 anos, inicialmente nos municípios de Avaré e Jaboticabal, e depois em São Paulo (1924). Ao chegar à capital, teve de permanecer algumas semanas trancada num hotel em frente à Estação da Luz, porque os revolucionários de 1924 haviam parado a cidade.
Em 1930, presenciou a chegada de Getúlio Vargas à esquina da rua Direita com a Praça do Patriarca. Um de seus filhos participou da Revolução Constitucionalista de 1932.

foto_cora_1[1] 
A mulher Anna

Com a morte do marido, passou a vender livros. Posteriormente, mudou-se para Penápolis, no interior do Estado, onde passou a produzir e vender linguiça caseira e banha de porco. Mudou-se em seguida para Andradina, até que, em 1956, retornou para Goiás.
Ao completar 50 anos de idade, a poeta relata ter passado por uma profunda transformação interior, a qual definiria mais tarde como “a perda do medo”. Nessa fase, deixou de atender pelo nome de batismo e assumiu o pseudônimo que escolhera para si muitos anos atrás: Cora Coralina.
Durante esses anos, Cora não deixou de escrever poemas relacionados com a sua história pessoal, com a cidade em que nascera e com ambiente em que fora criada. Ela chegou ainda a gravar um LP declamando algumas de suas poesias. Lançado pela gravadora Paulinas Comep, o disco pode ser encontrado hoje em formato CD.
Foi ao ter a segunda edição (1978) de Poemas dos becos de Goiás e estórias mais saudada por Carlos Drummond de Andrade no Jornal do Brasil, em 27 de dezembro de 1980, que Cora Coralina passou a ser admirada por todo o Brasil. “Não estou fazendo comercial de editora, em época de festas. A obra foi publicada pela Universidade Federal de Goiás. Se há livros comovedores, este é um deles.” Manifesta-se, então, o poeta Drummond.

cora_coralina 
A poeta Anna

A primeira edição de Poemas dos Becos de Goiás e estórias mais, seu primeiro livro, foi publicada pela Editora José Olympio em 1965, quando a poetisa estava com 75 anos. O livro reúne os poemas que consagraram seu estilo e a transformaram em uma das maiores poetas de Língua Portuguesa do século XX. Onze anos depois da primeira edição de Poemas dos Becos de Goiás e estórias mais, compôs, em 1976, Meu Livro de Cordel. Finalmente, em 1983 lançou Vintém de Cobre – Meias Confissões de Aninha (Editora Global).
Cora Coralina recebeu o título Doutor Honoris Causa da UFG em 1983. E, logo depois, no mesmo ano, foi eleita Intelectual do Ano e contemplada com o Prêmio Juca Pato da União Brasileira de Escritores. Em 31 de janeiro de 1999, a sua principal obra, Poemas dos Becos de Goiás e Estórias Mais, foi aclamada através de um seleto júri organizado pelo jornal O Popular, de Goiânia, como uma das vinte obras mais importantes do século XX.
Em 10 de abril de 1985, Cora Coralina faleceu em Goiânia, tendo sido a  sua casa na Cidade de Goiás transformada no museu que guarda sua história de vida e sua produção literária.


Obras Publicadas

PoesiaCORALINA, Cora. Poemas dos Becos de Goiás e Estórias Mais. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1965.
CORALINA, Cora. Meu Livro de Cordel. Livraria e Editora Cultura Goiana, 1976, p. 93.
CORALINA, Cora. Vintém de Cobre: Meias Confissões de Aninha. UFG Editora, 1983, p. 195.
CORALINA, Cora. O tesouro da Casa Velha. [publicação póstuma]. São Paulo: Global, 1996.
CORALINA, Cora. Vila Boa de Goyáz. [publicação póstuma]. São Paulo: Global, 2001.
Conto CORALINA, Cora. Estórias da Casa Velha da Ponte. São Paulo: Global, 1985.
Infantil e juvenil CORALINA, Cora. Os Meninos Verdes. São Paulo: Global, 1986.
CORALINA, Cora. A Moeda de Ouro que um Pato Engoliu. [publicação póstuma]. São Paulo: Global, 1999.
CORALINA, Cora. O Prato Azul-Pombinho. [publicação póstuma]. São Paulo: Global, 2002.
Referência:
WIKIPEDIA. Cora Coralina. Disponível em:  . Acesso em: 21 out. 2012.
Ilustrações:Foto 1 – Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas – Foto de autor desconhecido.
Disponível em:
Foto 2 – A jovem Anna – Foto de autor desconhecido.
Disponível em: Disponível em: http://elfikurten.blogspot.com.br/2011/12/cora-coralina-venho-do-seculo-passado-e.html
Foto 3 – Foto 2 – A poeta e contista Anna – Foto de autor desconhecido.
Disponível em: .
Foto 4 – A mulher Anna – Foto de autor desconhecido.
Disponível em: .
Foto 5 –  A poeta Anna – Foto de autor desconhecido.
Disponível em: .
Vídeo:
Gyn Teen conta a história de Cora Coralina
Produção: Gyn Teen.avi
Disponível em: .

.

Nenhum comentário: