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Por Carlos Henrique Machado Freitas
Não acreditei quando li o artigo de Gilberto
Dimenstein (Folha) “Haddad precisa importar um baiano?”. Impossível não
revelar suas convicções ou opiniões abertamente xenófobas. É nítida a
chantagem de seu texto evocando a “inteligência paulista” que, segundo
ele, estranhou que Haddad precisasse importar um baiano – Juca Ferreira –
para a Secretaria de Cultura.
A primeira coisa que me veio à memória foi a carta do
paulistano Mário de Andrade, o mais brasileiro dos brasileiros, falando
das opiniões de balcão que ficam na vitrine prontas para quem oferecer
preço maior.
Mário, em carta escrita a Guilherme Figueiredo,
publicada no livro “Lição de Guru” atacava os que pleiteavam o título de
“inteligência nacional” e suas reivindicações acintosas para um
determinado grupo obter vantagens particulares, na verdade exercidas por
uma sociedade de editores.
Provavelmente a arrumação do texto de Gilberto
Dimenstein seja fragmentos de uma coleção de ataques que aconteceram
durante a gestão de João Sayad a Juca Ferreira por conta da reforma da
Lei Rouanet que teve seu ápice em um debate no auditório da Folha aonde
Sayad usou um repertório dos antigos preconceitos contra nordestinos
para justificar a concentração de recursos da lei em mais de 70% na
capital paulista. O que na verdade nem assim pode ser classificado, pois
seria uma falsa descrição. Porque o nível de concentração que talvez
reflita o sentimento dessa “inteligência paulista” contra Juca Ferreira é
de uma meia-dúzia de confessos gestores paulistanos nascidos em ninhos
tucanos e que tramitam como ninguém nos corredores empresariais e
políticos da Avenida Paulista para elaborar a mais extraordinária
“estética de captação de recursos públicos” e que faz a riqueza de
poucos sem dar explicações que iluminem minimamente os caminhos desses
recursos à sociedade.
Na realidade o artigo de Dimenstein não é mera
advinhação, por mais mal escrito que seja seu desaforo “cultural” contra
Juca Ferreira. É perceptível que o articulista trabalhou duro para
escrever uma pérola genuinamente estúpida sobre cultura, como costumava
dizer Mário de Andrade aos que se metiam a impor suas verdades a partir
não só de sua desonestidade, mas pelo horror de não compreender sequer
em que país vive.
Pra piorar, o artigo de Dimenstein vira um baloneiro
da economia criativa, sem tentar reproduzir, como é comum, as úteis e
reveladoras políticas que dão dimensão à locomotiva da estupenda
economia que até hoje não saiu do papel em lugar nenhum de suas
prometidas fornalhas.
Mas é bom que isso tenha se revelado dessa forma,
afinal esse tipo de agressividade se transformou em um pastiche cultural
da Folha com um punhado de artigos e editoriais com afirmativas
“inéditas” que não devem ser recomendados a alguém que tenha um mínimo
de inteligência, tal a análise sofrível que a Folha faz sobre o
Vale-Cultura, sobre a gestão de Marta Suplicy e a chegada de Juca
Ferreira à Secretaria de Cultura da cidade de São Paulo.
Para se ter a exata dimensão do que está acontecendo
em São Paulo a partir do que se pode chamar de Sayadismo cultural, que é
uma combinação de podridão européia com missangas douradas, a obra de
Mário de Andrade que, percebendo já em 1917, a capacidade antropofágica
que surgia fora da “posição dos intelectuais oficiais”, Mário o
idealizador da I Semana de Arte Moderna em 1922, tambem mergulhou
profundamente em estudos sobre o norte e o nordeste brasileiros para
explicar não só o Brasil, mas a própria São Paulo.
As suas viagens etnográficas, seus estudos que até hoje são o
principal tesouro de nosso acervo cultural, se deram justamente para
sublinhar o que hoje é negado escancaradamente pelo artigo de Gilberto
Dimenstein refletindo as ideias distantes da realidade paulista e
brasileira para se jogar num fanatismo politico carregado de xenofobia
que asfixiou a relação das instituições culturais de São Paulo com o que
a cidade tem de mais rico. Tudo seguindo rigorosamente o processo que
privatizou e terceirizou para as OSs a cultura de São Paulo pelos
gestores tucanos refletido nessa marafunda xenófoba de Dimenstein.
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