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Lamentavelmente,
quem mais abusa do direito no Brasil é justamente quem mais poder
detém, principalmente bancos, empresas de telefonia, cartões de crédito,
planos de saúde, seguradoras, empresas de tv a cabo, que são os maiores
“clientes” do Poder Judiciário. Os abusos são frequentes dentro do
processo, a ponto de se concluir que o processo melhor serve a quem não
tem razão, pois quem a detém passa por uma verdadeira “via crucis” para
ver atendida sua pretensão. Esses poderosos litigantes pouco se importam
se têm ou não razão.
Editorial Carta Maior
A
efetividade do processo, à luz do direito processual civil
contemporâneo, inclui a necessidade de que (a) os instrumentos de tutela
sejam adequados aos direitos a resguardar; (b) sejam praticamente
utilizáveis pelos titulares dos direitos cuja preservação ou
reintegração se cogita; (c) ao julgador sejam asseguradas condições de
convencimento, tanto quanto possível, fiel à realidade; (d) em toda a
extensão da possibilidade prática, o resultado do processo há de ser tal
que assegure à parte vitoriosa o gozo pleno da específica utilidade a
que faz jus segundo o ordenamento; (e) possa ser atingido semelhante
resultado com o mínimo dispêndio de tempo e energias.
O
abuso de direito processual, a litigância de má-fé, significa um
entrave a tais necessidades. Embora, em princípio, os meios processuais
conferidos ao titular da pretensão possam ser, aparentemente, adequados
aos direitos que necessitam de resguardo, na prática, por meio do exame
com as lentes adequadas, a escolha deles está à serviço da injustiça. A
rigor, os instrumentos do abuso de direito processual não são os
“utilizáveis”. Eles até são os “possíveis”, mas o uso deles é inadequado
dentro de um devido processo legal que não pode servir à chantagem ou
ao espírito emulativo.
Na presença de conduta de
abuso processual, são excluídas ao juiz as claras condições de
convencimento. Provas, fatos e o verdadeiro sentido das medidas
judiciais são omitidos, a fim de se obter um provimento cuja função não
é, no mais das vezes, assegurar à parte vitoriosa a utilidade da
decisão, naquele procedimento. O que se deseja é um “pouco mais”, sempre
escondido pelo agente do abuso. A rigor, haverá oportunidades em que
nem mesmo a vitória no processo será relevante, o simples pedido já será
suficiente para que se atinja o objetivo ilegal.
A
lição de Barbosa Moreira ainda se aplica à vedação do abuso de direito
no processo na medida em que propõe que o bem da vida a ser entregue no
processo deva ser alcançado com o mínimo dispêndio de tempo e energias. A
energia em excesso é sinônimo de abuso de direito processual e tem
efeitos nocivos no que concerne ao tempo para solução da (ou das)
contenda(s).
O processo – o devido processo
legal –, para que possa atingir o seu fim, que é a entrega da justiça,
deve ser um instrumento ético. Há que ser equânime e justo, seguindo os
parâmetros éticos e morais da sociedade.
O
processo até pode ser considerado um jogo, mas não é “um vale tudo”. Há
regras que devem ser respeitadas. O processo civil é instrumento de
pacificação social e tal atividade está além das pretensões das próprias
partes. O processo é um verdadeiro jogo, um duelo, não só entre as boas
razões para seu deslinde, mas também pela habilidade de se fazer uma
boa razão, sem abuso.
Nesse contexto, as partes,
os intervenientes, os advogados, os serventuários da justiça, os
magistrados e os demais envolvidos na distribuição da justiça (inclusive
peritos, tradutores etc.) têm o dever de respeitar as regras do jogo,
de forma proba, sob pena de a cláusula do devido processo legal ser
infringida no exercício da jurisdição. Caso o “fair play” não seja
respeitado, é preciso reparar o dano a quem o sofreu.
No
Brasil, nas instâncias inferiores e nos tribunais superiores, a
aplicação de multa, por litigância de má fé, não é uma prática usual,
pelo menos, da forma que deveria ser, já que a Lei Processual possui
dispositivos claros que determinam a aplicação da multa, toda vez que
infringida a regra do convívio harmonioso e legal.
Lamentavelmente,
quem mais abusa é justamente quem mais poder detém. Principalmente os
bancos, empresas de telefonia, cartões de crédito, planos de saúde,
seguradoras, empresas de tv a cabo, que são os maiores “clientes” do
Poder Judiciário.
Os abusos são frequentes
dentro do processo, a ponto de se concluir que o processo melhor serve a
quem não tem razão, pois quem a detém passa por uma verdadeira “via
crucis” para ver atendida sua pretensão. Esses poderosos litigantes
pouco se importam se têm ou não razão. Para eles não faz diferença se a
jurisprudência é contrária as suas práticas. Seguem fazendo o que sempre
fizeram, até porque muitos dos poucos que têm a coragem, dinheiro e
paciência de chegarem ao Poder Judiciário acabam “cansando” no meio do
caminho.
Assim, a lentidão da justiça, muitas
vezes, não é culpa exclusiva do juiz. É culpa da parte que abusa e culpa
do juiz que não pune, ou que aplica a lei somente em favor dos
poderosos. Por isso, quando o judiciário é flácido e deixa o processo
seguir de acordo com os “ventos da litigância desleal”, como uma nau à
deriva, o Estado passa a se incluir como um dos atores do abuso, na
posição de verdadeiro cúmplice.
No dia 6 de
janeiro deste ano, o Superior Tribunal de Justiça, mesmo no período de
seu recesso, divulgou uma preciosa notícia, com o seguinte título: “Litigância de má fé: a ampla defesa desvirtuada pela malícia processual”.
O
artigo conclui que o tribunal começa a punir a litigância de má fé,
diante de práticas processuais meramente protelatórias ou mesmo em
evidente deslealdade processual.
É uma
extraordinária notícia, mas não basta ficar somente na notícia, é
preciso aplicar de forma contundente penas, que no caso, são multas
previstas na lei processual, a todos que desrespeitem a Lei, mesmo que
sejam bancos, empresas de telefonia, cartões de crédito, planos de
saúde, seguradoras, empresas de tv a cabo, etc., contumazes violadores
da legislação brasileira.
Não é necessária
nenhuma reforma do Código de Processo Civil, que já passou por inúmeras e
os problemas só fizeram crescer. Não é a quantidade de recursos que
promove a demora na aplicação da Lei. No quadro atual, não há que se
falar em falta de estrutura, de funcionários e de juízes, antes de mais
nada é preciso cumprir a Lei.
Não é mais
possível suportar que um processo tramite por mais de quinze anos nos
tribunais brasileiros. A Justiça é morosa, mas é muito mais leniente e
deve, imediatamente, retirar a venda e enxergar que o processo não pode
servir como um meio para quem não quer a justiça.
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