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Tese
defendida em 2009 mostrou que somente 1% do produto pulverizado por
avião é absorvido pela lavoura. O restante se dissipa pelo ar, água e
solo
Agricultura brasileira ainda utiliza 22 produtos químicos proibidos pela União
Europeia e EUA. Anvisa tenta barrar 14 dessas substâncias
na Gazeta do Povo
O Brasil, um dos maiores produtores agrícolas do mundo, é uma das nações
mais atrasadas no controle de agrotóxicos. Dos 50 produtos químicos
mais aplicados na agricultura, 22 são proibidos pela União Europeia (UE)
e Estados Unidos, mas continuam sendo largamente utilizados em
território brasileiro, apesar dos riscos que oferecem à saúde.
Entre eles, agentes que causam cegueira, má formação fetal, câncer (em
especial os de tireoide e mama), puberdade precoce, problemas
respiratórios e disfunções renais, de acordo com relatórios técnicos de
várias entidades lançados neste ano e que corroboram alertas feitos pela
Organização Mundial da Saúde (OMS) em anos anteriores.
Estudo
Pesticidas causam desequilíbrio no organismo e diversas doenças
Os malefícios dos agrotóxicos no corpo humano são conhecidos há pelo
menos duas décadas, embora somente nos últimos anos pesquisadores tenham
conseguido juntar um número suficiente de estudos para comprovar seu
efeito cumulativo na saúde ao longo de anos de exposição. São casos
agudos (intoxicação por pequenas doses, num curto espaço de tempo) ou
crônicos, quando ocorre manipulação prolongada de várias substâncias ou
ainda no ventre materno, o que interfere no desenvolvimento fetal e
causa deformações incuráveis.
Segundo a chefe do Setor de Endocrinologia do Hospital Evangélico de
Curitiba, Mirnaluci Ribeiro Gama, tais substâncias químicas, chamadas de
disruptores endócrinos, têm o poder de simular ou bloquear a ação dos
hormônios produzidos pelo corpo, o que gera desequílibrios metabólicos e
multiplicações celulares que podem levar ao câncer. “Glândulas como a
tireoide, testículos e ovários, assim como o tecido adiposo, são os mais
frequentemente acometidos”, explica.
Estrogênio
Um exemplo, cita a médica, ocorre com os hormônios sexuais, em especial o
estrogênio. Meninas expostas a agrotóxicos entraram na puberdade antes
do tempo. Substâncias presentes nesses agentes, chamadas de
xenoestrógenos, enganam o organismo e simulam o papel do hormônio,
induzindo as meninas a menstruar precocemente. A exposição ao estrogênio
por um período maior do que o programado pela natureza também aumenta o
risco de câncer de mama, já que este hormônio alimenta os receptores de
estrogênio das células mamárias.
Nos homens, foi comprovado o aumento de casos de infertilidade, devido à
redução do número de espermatozoides em indivíduos expostos aos
produtos. Os agrotóxicos também são uma das causas comprovadas do Mal de
Parkinson, além de alguns casos de leucemia, linfomas e mielomas
múltiplos.
Exceção
Desde
2008, 14 substâncias químicas estão na mira da Anvisa. Destas, quatro
foram ou devem ser retiradas do mercado, mas nos demais casos, a
discussão pouco avançou. Confira quais são as substâncias, o que causam,
a situação atual sobre sua discussão e em que países já são proibidas:
Abamectina
Toxicidade aguda e suspeita de toxicidade reprodutiva; Ainda não foi
discutida; única substância não proibida pela União Europeia.
Acefato
Neurotoxicidade, carcinogenicidade e toxicidade reprodutiva; Já houve
consulta pública para seu banimento, mas decisão não foi publicada;
União Europeia.
Carbofurano
Alta toxicidade aguda e desregulação endócrina; Ainda não houve consulta pública; União Europeia e EUA.
Cihexatina
Alta toxicidade aguda, carcinogenicidade para seres humanos, toxicidade
reprodutiva e neurotoxicidade; retirado do mercado em novembro de 2011;
União Europeia, Japão, EUA e Canadá.
Endossulfam
Alta toxicidade aguda, desregulação endócrina e toxicidade reprodutiva;
Será retirado do mercado em julho de 2013; União Europeia e Índia.
Forato
Alta toxicidade aguda e neurotoxicidade; Já houve consulta pública, mas não foi publicada decisão; União Europeia e EUA.
Fosmete
Neurotoxicidade; já houve discussão e produto será mantido no mercado com restrições; União Europeia.
Glifosato
Intoxicação (há solicitação de revisão da Ingesta Diária Aceitável (IDA)
por parte de empresa registrante, necessidade de controle de impurezas
presentes no produto técnico e possíveis efeitos toxicológicos
adversos); Não houve consulta pública; Em revisão pela União Europeia.
Lactofem
Carcinogênico; não houve consulta pública; União Europeia.
Metamidofós
Alta toxicidade aguda e neurotoxicidade; Foi retirado do mercado em julho deste ano; União Europeia, China e Índia.
Paraquate
Alta toxicidade aguda e toxicidade; Não houve consulta pública; União Europeia.
Parationa Metílica
Neurotoxicidade, desregulação endócrina, mutagenicidade e
carcinogenicidade; já houve consulta pública, mas decisão não foi
publicada; União Europeia e China.
Tiram
Mutagenicidade, toxicidade reprodutiva e desregulação endócrina; não houve consulta pública; EUA.
Triclorfom
Neurotoxicidade, potencial carcinogênico e toxicidade reprodutiva; retirado do mercado em 2010; União Europeia.
Fonte: Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida -www.contraosagrotoxicos.org
Desde 2008, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) alerta
para a necessidade de vetar o uso dessas substâncias, mas somente agora,
com o veto de países a produtos brasileiros cultivados com alguns
agrotóxicos, é que a discussão ganhou corpo. A agência estuda proibir
dez substâncias, além de quatro que já tiveram sua retirada do mercado
aprovada.
Nessa relação está o endossulfam, cujos efeitos foram primeiramente
notados num vilarejo na Índia, onde 6 mil pessoas (cerca de 50% dos
domicílios), a maioria crianças, apresentaram graves deformações físicas
e neurológicas. O produto só deve ser banido em 2013, de acordo com a
agência. Na UE, ele está proibido desde 1985.
“Após a revolução verde [disseminação de práticas agrícolas, entre elas o
uso de produtos químicos, que permitiu o aumento da produção nos anos
70], estamos vivendo a revolução vermelha. É um modelo
químico-dependente que está causando um sério problema à saúde. Há
evidências científicas disso há muito tempo”, afirma o pesquisador da
Universidade Federal do Mato Grosso Wanderlei Pignati, que coordenou um
estudo sobre agrotóxicos que foi apresentado na Conferência das Nações
Unidas sobre Sustentabilidade, a Rio+20, em junho, no Rio de Janeiro.
Além do limite
A aplicação de agrotóxicos além do Limite Máximo de Resíduos (LMR)
permitido de acordo com a legislação também preocupa porque gera uma
série de complicações em trabalhadores do campo e consumidores.
Relatório de 2010 do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em
Alimentos (Para), da Anvisa, revelou que 28% de 2.488 amostras de
alimentos analisadas continham substâncias autorizadas, mas acima do
LMR, ou proibidas. De acordo com o Ministério da Saúde, o uso
indiscriminado de agrotóxicos causou 7.677 casos de intoxicação no país
em 2009.
“O Brasil é hoje o maior consumidor mundial de agrotóxicos e existe
muita pressão das empresas para que esse modelo seja mantido. Há um
esforço da Anvisa para controlar e proibir essas substâncias, mas as
empresas entram na Justiça para barrar a discussão”, explica a assessora
jurídica da organização Terra de Direitos, Ana Carolina Brolo de
Almeida.
Em 2008, quando as discussões para a proibição das 14 substâncias se
iniciaram, as empresas conseguiram suspender a publicação dos resultados
dos estudos por dois anos. Em 2010, o processo foi retomado, mas devido
ao atraso, as discussões não avançaram. A reportagem enviou perguntas
por e-mail à Anvisa, mas o órgão não se pronunciou até o fechamento
desta reportagem.
Pulverização aérea é
ineficiente
Além de permitir o uso de substâncias que já são proibidas em países
desenvolvidos, o Brasil adota outra prática banida pela União Europeia
desde janeiro de 2009: a pulverização aérea de plantações, que, no
intuito de abranger a maior área possível de cultivo, também contamina o
ar, solo, mananciais, estradas e até vilarejos a quilômetros de
distância.
Tática de guerra
“É uma prática que lembra uma guerra [Vietnã], usar avião para despejar
veneno. É preciso proibir essa prática o mais rápido possível”, diz o
médico e pesquisador da Universidade Federal de Mato Grosso Wanderlei
Pignati, um dos maiores especialistas no assunto. A pesquisadora do
Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)
Isabel Fontes Jardim concorda. Uma tese de doutorado orientada por ela
em 2009 mostrou que, além de prejudicial à saúde, a prática é ineficaz.
“Somente 1% do produto aplicado atinge o alvo. Os 99% restantes vão para
o ar, água e solo.”
Especialista em agrotóxicos e sua relação com doenças, a médica e
pesquisadora da Universidade Federal do Ceará Raquel Rigotto diz que as
normas brasileiras que determinam limites para a prática são ineficazes –
como uma distância mínima de 500 metros para povoados e de 250 para
mananciais. “Num ecossistema, isso [os limites] é muito pouco. Há vários
aspectos que interferem, como os ventos, a temperatura, a umidade. Não
há como controlar. Portanto, a prática precisa ser abolida.”
Para se aprofundar
Acesse
os relatórios já publicados sobre agrotóxicos pela Anvisa, Câmara dos
Deputados e Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), este
último apresentado na Rio+20:
Anvisa: http://migre.me/b78c3
Abrasco
Relatório I: http://migre.me/b78cS
Relatório II: http://migre.me/b78dG
Câmara dos Deputados: http://migre.me/b78em
2 comentários:
Oi Jader! Tratam-nos como idiotas porque até então não tínhamos informação suficiente (ou nenhuma). Parece que quanto maior o empreendimento agrário, mais pesticida é usado. Sigo o raciocínio de que em pequenas propriedades, onde a própria família trabalha, não deixaria isso acontecer, pois não contaminariam a si mesmos e nem os mananciais onde pegam água para sobreviver.
Fernando, eu como muita gente não imaginava o que esta escrito na legenda da primeira foto do post, vale reproduzir:
Tese defendida em 2009 mostrou que somente 1% do produto pulverizado por avião é absorvido pela lavoura. O restante se dissipa pelo ar, água e solo
Grande abraço
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