buscado no Brasil de Fato
Se o conjunto da sociedade brasileira não pautar, reivindicar e cobrar de fato a reforma agrária, não se conseguirá realizá-la
09/01/2013
Editoral da edição 515 do Brasil de Fato
Mais um ano se passou e a reforma agrária ficou parada. Em 2012, foram poucos os investimentos do governo na produção dos camponeses e nos assentamentos. Mas esse cenário não é privilégio apenas do ano que se passou. Surpreendentemente, nos oito anos do governo neoliberal de Fernando Henrique Cardoso foram criados 4.410 assentamentos. Na década de Lula/Dilma, o número foi de 3.711. Os dados são do Dataluta/Unesp – Banco de dados da Luta pela Terra. O exemplo é que em 2005, Lula chegou a desapropriar por decreto 400 imóveis. Em 2011, Dilma desapropriou somente 58. No ano de 2012, a situação é pior: 18 imóveis desapropriados. Isso reflete o não enfrentamento do governo em relação ao agronegócio.
O fato é que a regularização de terras públicas ocupadas tem sido o modo mais viável para o Executivo exercer a famigerada governabilidade junto à bancada ruralista.
O que se observa é que a reforma agrária não é prioridade do governo. Ou seja, a reforma agrária não está na agenda de prioridades do governo. E isso está desse modo por algumas razões. A central está associada ao projeto estratégico de interesse das empresas transnacionais que controlam de forma direta ou indireta o agronegócio brasileiro da “meia dúzia” de produtos nobres.
Houve uma abertura ao capital externo, inclusive na apropriação das terras. Foram desenvolvidos amplos e diversificados instrumentos de estímulos econômicos e financeiros ao agronegócio, com inovações recentes introduzidas pelo novo Código Florestal para os agronegócios verdes tendentes a estimular fenômeno de reconcentração fundiária. Foi flexibilizada a política ambiental; estabelecido estado de vulnerabilidade para as áreas protegidas como um todo; implementado o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), para permitir a saída pelo Pacífico para os produtos primários brasileiros; e viabilizada a criação de “empresas brasileiras de classe mundial” para a disputa desses mercados.
As elites brasileiras, cada vez mais subordinadas aos interesses do capital estrangeiro e dos bancos, estão implementando um novo modelo, baseado nesse capital financeiro e internacional. O chamado neoliberalismo. Mas esse modelo só agravou os problemas do povo.
Não cabe mais reforma agrária numa economia que tem seu centro apenas nas exportações, nos bancos e nos grandes grupos econômicos. Cerca de 200 empresas controlam a maior parte da economia e 78% de todas as exportações. Por isso, a imprensa empresarial fala o tempo todo que não tem mais sentido a reforma agrária.
Reforma agrária não é apenas pegar um grande latifúndio, dividi-lo em lotes e largar lá os pobres do campo para que se virem. A reforma agrária ficou mais complexa porque o capital estrangeiro, as transnacionais, os grandes grupos econômicos tomaram conta da nossa agricultura, para exportar matérias primas, para produzir celulose e energia, para seu modo de consumo. No entanto, mais do que nunca, é necessária uma reforma agrária. Uma reestruturação não só da concentrada propriedade da terra no Brasil, mas do jeito de produzir.
Cabe aos movimentos continuarem cumprindo seu papel organizador, mobilizador e de pressão social. Devem continuar organizando os trabalhadores sem-terra pelo país e pressionar os governos para que cumpram sua responsabilidade, punindo o latifúndio improdutivo e realizando de fato uma verdadeira reforma agrária.
Mas, para isso, são necessárias a articulação e a unidade dos movimentos sociais do campo, que tiveram início no ano passado com o encontro unitário – organizado em agosto pelos movimentos sociais, sindicatos e organizações de indígenas, quilombolas e ribeirinhos. Temos que continuar trabalhando para garantir a unidade das lutas e pautas de todos movimentos sociais do campo, para que isso garanta uma maior pressão sobre o governo federal.
Os movimentos devem continuar organizando as áreas de assentamento, tanto nos quesitos culturais, de educação, da formação técnica e política dos assentados, para que produzam alimentos de qualidade, livre de agrotóxicos, para a população do campo e da cidade.
Outro desafio importante é denunciar para a sociedade o uso dos agrotóxicos, que é um grande vilão do agronegócio. A sociedade está ganhando uma consciência do mal que o agronegócio faz, com sérias consequências para as pessoas, ao meio ambiente e para o conjunto da sociedade com o alto uso de venenos no campo.
É preciso ganhar a simpatia da sociedade para a realização da reforma agrária porque ela não vai se concretizar apenas com a pressão dos movimentos do campo. Se o conjunto da sociedade brasileira não pautar, reivindicar e cobrar de fato a reforma agrária, não se conseguirá realizá-la.
Portanto, em 2013, é momento também de exigirmos que se faça definitivamente a reforma agrária em nosso país. Somente com uma verdadeira reforma agrária poderemos garantir vida digna aos trabalhadores do campo, para produzir alimentos saudáveis para todo o povo brasileiro.
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