"Sou mais feliz porque as raízes da Revolução Cubana se encontram em Martí, por seu compromisso com a humanidade e com o meio ambiente: sempre me sinto orgulhosos de voltar a essa ilha, onde o capitalismo foi derrotado no longínquo 1959", me confessa o frei brasileiro.
Continua explicando-me sua opinião e enumerando todas as calamidades criadas pela economia de mercado, isto é, a fome, a desnutrição, a falta de água potável, o trabalho sob condições de escravidão que atinge a maioria das populações, enquanto a riqueza se agrupa em poucas famílias.
"E tudo isso nos levou à crise mundial atual, que demonstra o fracasso do capitalismo como sistema", me diz fervorosamente e com uma luz decidida que demonstra sua grande paixão pelos mais despossuídos.
Enquanto conversamos, estamos protegidos pela urna das cinzas de outro sacerdote revolucionário, Félix Varela, que é considerado o primeiro a ensinar seus compatriotas cubanos a pensar; e nesse marco Frei Betto chama minha atenção para o fato de que a América Latina inteira está vivendo uma importante etapa de sua história. Nos últimos 50 anos, sucederam-se três fases: a primeira foi terrivelmente caracterizada pelas ditaduras militares; a segunda, pelo neoliberalismo (ambos derrotados pelas forças populares) e agora é a etapa onde existe uma maioria de governos progressistas, a mais luminosa de todos os tempos.
"Nos últimos 10 anos, após a vitória de Chávez, na Venezuela, governos inovadores, que estão a favor dos mais débeis, começaram a vencer as eleições. Todas essas revoluções das urnas têm levado a uma força econômica e social muito grande, que têm à sua disposição associações regionais que incomodam o inimigo do Norte, os Estados unidos, porque tiram-lhe hegemonia e o golpeiam do ponto de vista econômico".
"O exemplo preocupante desse momento histórico, que para mim é somente uma prova, isto é, o princípio do que poderia ser uma série, é o golpe de Estado em Honduras", me confessa alarmado e, sem dúvida, está recordando e revivendo dentro de si mesmo aqueles dias tristes que teve que viver no Brasil, torturado e acossado como prisioneiro político de uma ditadura militar.
"O que mais me preocupa é que Obama, que não é absolutamente diferente de Bush, somente é mais inteligentemente sutil e mais astuto, com o golpe de Estado em Honduras quis infundir esperança e força à direita política na região, tacitamente empurrando-a a realizar outros golpes de Estado. Como se esses 50 anos não houvessem passado; tudo isso para demonstrar a força do império, sua brutalidade e total falta de respeito aos direitos humanos".
"É por essa razão que a comunidade internacional tem que intervir isolando completamente o governo de fato de Honduras e continuar exigindo o regresso da democracia, a restituição do presidente Zelaya e, sobretudo, o castigo aos brutais assassinos do povo. É duro admitir que estão fazendo de tudo para levar um movimento maravilhosamente pacífico à violência, um povo atrevido e com uma grande dignidade que tem contestado tão forte e contundentemente os horrores da morte e da violência, apesar de sua luta pacífica".
E somente para recordar os últimos fatos brutais quero sublinhar os que estão agora na mira dos verdugos enviados pelos ‘gorilas’ são os familiares dos líderes da Resistência hondurenha: depois do terrível homicídio do irmão e do cunhado de Arcadia Gómez, ex0ministra de Manuel Zelaya, esta vez mataram sem escrúpulos o irmão e o cunhado de Porfirio Ponche, vice-secretário do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria das Bebidas e Similares (STIBYS).
"Para salvar a humanidade da catástrofe de uma guerra, aonde parece que os senhores dos EUA querem conduzir-nos, posto que eles só pensam em armas, bens materiais; estão acostumados a roubar os povos mais pobres e não conhecem a palavra solidariedade, temos que criar uma nova sociedade onde todo o conjunto de coletividades se transforme em um modelo pedagógico que privilegie suas raízes e, assim, busquem os mesmos projetos".
"Eu creio em Deus; porém, não no mesmo Deus em que Bush crê; sinto vergonha quando os países mais imperialistas e colonialistas têm o ânimo de definir-se hegemonicamente cristãos".
"Hoje em dia, para tentar salvar a humanidade temos que considerar as ideias de José Martí, que pensou na libertação de todo o continente em duas dimensões: a emancipação política e a espiritual"; expressou a necessidade de darmos muita importância à educação ética das atuais e das novas gerações.
Frei Betto termina a conversa com um chamado de amor pelo povo cubano e sua Revolução, com uma preocupação que temos todos os povos revolucionários internacionalistas, que sabemos perfeitamente que o socialismo em um só país, isolado de outros, não pode prosperar: "Vocês, os cubanos, não têm direito de decepcionar a humanidade; não têm direito a voltar atrás nesse esforço de construir um povo solidário, um povo feliz".
E eu agrego: por favor, não nos esqueçamos do Movimento de Resistência Hondurenha!
Fonte: Adital
Copiado do Vermelho
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