20-22/4/2012,
Franklin Lamb (de Beirute), Counterpunch
Traduzido pelo pessoal
da Vila Vudu
Franklin Lamb
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Os pesquisadores terão
talvez de examinar nada menos que 14 séculos, do século 3 AC até o
início do século 17, para encontrar outro regime que construa muros
e barreiras em tal frenesi, na tentativa desesperada de conseguir
manter-se sobre terras roubadas, semelhante ao que nós logo veremos
também aqui, no sul do Líbano, na fronteira com Israel. No ano 221
AC, para proteger a China contra a invasão do povo Xiongnu da
Mongólia – e a tribo Xiongnu era, então, o principal inimigo da
China, e lutava para reconquistar terras que acusava os chineses de
terem roubado –, o imperador Qin Shi Huang ordenou que se
construísse um muro, para preservar as conquistas territoriais
chinesas.
Ao longo da história,
construíram-se muitos muros, para proteger terras ocupadas. Os
romanos construíram o Muro de Adriano na Grã-Bretanha, para manter
os pictos do lado de fora; e os alemães do leste construíram o Muro
de Berlin, para manter do lado de dentro quem quisesse sair dali. Mas
nenhum regime na história construiu, em 60 anos, a quantidade de
muros que foram e continuam a ser erguidos pelo paranoico governo de
Telavive. Agora, planejam outros cinco novos muros, chamados
“barreiras de proteção antiterroristas”, entre os quais um,
cuja construção deve ser iniciada em breve, sobre a fronteira entre
Líbano e Palestina, na cidade libanesa de Kfar Kila. E esse muro
pode vir a criar problemas ainda mais graves que outros.
A decisão de erguer um
muro “para substituir a barreira técnica israelense existente”
ao longo da Linha Azul, junto à cidade de Kfar Kila, foi anunciada
por Telavive na semana passada. O anúncio aconteceu depois de uma
reunião entre militares israelenses e a UNIFIL [orig. United
Nations Interim Force In Lebanon, Força Provisória da ONU no
Líbano] e os dois lados continuam estranhamente silenciosos sobre
esse novo muro; mas o porta-voz da UNIFIL, Neeraj Singh, deixou
escapar, em conversa comigo, que a primeira parte do muro terá cerca
de 500m comprimento e cerca de 5m de altura.
Moradores do sul do
Líbano opõem-se fortemente à construção da muralha, dentre
outras razões, porque bloqueará a visão das belas paisagens da
Palestina que se veem dali. Outros tem rido das razões apresentadas
pelo lobby EUA-Israel, que pedirá ajuda aos contribuintes
norte-americanos para as despesas de construção do muro.
David Schenker,
conhecido militante pró-Israel (até quando ser pró-Israel implica
ser contra os EUA; em ing. Israel firster), ligado ao Institute for
Near East Policy, em Washington, associado ao AIPAC, disse em
audiência no Congresso, recentemente:
“O sul do Líbano é
área obviamente muito sensível [para Israel], muito próxima de
Metula e via pela qual o Hezbollah e palestinos podem infiltrar-se. A
preocupação de Israel é legítima. O governo israelense crê que o
muro, naquele ponto, impedirá que terroristas lancem ataques diretos
com foguetes e morteiros. Impedirá também que turistas que visitam
a região lancem pedradas contra Israel, o que muitos fazem e já se
tornou praticamente um hábito”.
Observadores locais,
oficiais da UNIFIL e especialistas como Timor Goksel, que trabalhou
por 24 anos como porta-voz da UNIFIL na área da Linha Azul, têm-se
mostrado surpresos e intrigados por Israel andar falando tanto de
Kfar Kila como região particularmente perigosa, que necessitaria de
muros.
Nada, de fato, jamais
aconteceu ali; aquela área nunca foi perigosa nem “sensível”,
sequer quando a OLP controlava a região, nos anos 1970s. Goksel
explicou:
“Nos meus 24 anos de
experiência, jamais houve ataques nesse ponto, porque é muito
próximo de uma cidade libanesa; ataques nesse ponto criariam
dificuldades, sobretudo, para os libaneses que vivem ali. Que eu
saiba, ninguém jamais pensou em atacar ali. Além do mais, mesmo que
alguém invada o território israelense por Kifa Kula, é preciso
andar muito até encontrar o primeiro posto israelense. Não faz
sentido algum atacar aqui. Atacariam quem, nesse local?”
Moradores locais
comentam que o verdadeiro motivo para Israel querer erguer um muro em
Kfar Kila é impedir que soldados israelenses troquem ali armas e
informações, por drogas; como todos sabem na região, o problema do
consumo de drogas entre soldados de Israel no “Comando Norte”
aumentou muito, desde a campanha mal-sucedida de Israel, naquela
região, na guerra contra o Líbano, em julho de 2006.
O mais novo muro da
vergonha em Israel seguirá o traçado de outro muro, que está já
em construção, ao longo dos 700 km de fronteira entre os desertos
do Sinai e do Negev. Esse muro deverá estar construído até o final
de 2012. Então, se se somar o muro de Kfar Kila, Israel estará
quase completamente cercada por aço, arame farpado e concreto; com
uma única abertura, na fronteira com a Jordânia, entre o Mar Morto
e o Mar Vermelho, onde não há barreira física. Mas logo também
haverá um muro nesse ponto, segundo informação de Shenker;
explicou que o muro é necessário também ali, porque há
“incerteza” na Jordânia e o reino mostra-se cada vez mais
vacilante.
Há mais muro, a cerca
de 11km do Mediterrâneo, ao longo da fronteira sul, que se encontra
com a jaula que Israel já construiu em torno de Gaza. Esse muro
estende-se por 51km e é protegido por uma faixa de terra fortemente
minada; os palestinos não podem andar ali, e o muro invade cerca de
1km da estreita Faixa de Gaza; por causa desse muro, os palestinos
proprietários não conseguem chegar às suas melhores terras para a
agricultura. Esse “muro de segurança” mantém os palestinos
enjaulados dentro de Gaza, mas não impediu que o soldado Gilad
Shalit, do exército de Israel, fosse capturado, bem ali, em 2006.
Depois que Israel foi
expulsa do Líbano, em 2000, depois de 22 anos de ocupação, a
barreira ao longo da fronteira Palestina-Líbano foi reconstruída.
Essa barreira não impediu que o Hezbollah, em 2006, invadisse
território israelense e capturasse dois soldados israelenses, que
adiante foram usados numa troca, para libertar militantes que Israel
mantinha prisioneiros. Também não impediu que o Hezbollah
disparasse seus muitos mísseis, em guerra de retaliação que durou
33 dias, depois que Israel bombardeou e destruiu vastas áreas no sul
do Líbano.
Apesar disso, os “muros
de proteção” continuam a brotar do chão, como cogumelos depois
da chuva.
Mais para o leste do
Líbano, está sendo erguido outro muro, sobre a linha do cessar-fogo
traçada ao final da guerra de 1973, do Yom Kippur; passa entre as
colinas do Golan – que Israel ocupa ilegalmente há cerca de 45
anos – e a Síria. Exatamente por aí centenas de manifestantes
pró-palestinos entraram em território palestino ocupado, em maio
passado, pelo Golan e ao longo da fronteira libanesa. Mais de dez
manifestantes foram mortos, e muitos foram feridos, quando o exército
sionista abriu fogo contra manifestantes civis desarmados.
Um posto de passagem em
Quneitra, atualmente operado pela ONU, permite alguma mobilidade ao
pessoal da ONU, dá passagem a alguns caminhões carregados de maçãs,
a uns poucos estudantes drusos e a uma ou outra esporádica noiva
síria de véu e grinalda [1].
Poucos quilômetros ao
norte de Quneitra está a Colina dos Gritos [orig. Shouting Hill],
onde famílias drusas do Golan gritam, de um lado de uma faixa de
terra minada, para serem ouvidos pelos parentes e amigos que vivem na
Síria, do outro lado da faixa minada de território sírio ocupado
por Israel [2].
Rumo ao sul, por campos
e colinas pesadamente minados, a linha do cessar-fogo de 1973 é
semeada de bases militares e zonas militares vedadas, restos de
tanques que sobraram de outros combates, até que se conecta com a
fronteira com a Jordânia. Ali se une a um dos primeiros muros
construídos por Israel, ainda no final dos anos 1960s, e que hoje se
estende quase desde o Mar da Galileia, pelo Vale do Jordão, até o
Mar Morto. A maior parte dessa linha não é fronteira de Israel; é,
simplesmente, mais um muro, para separar a Jordânia, de um lado; e,
de outro a Cisjordânia ocupada por Israel.
A cerca de dois terços
do caminho, a barreira liga-se ao sempre infame muro de aço e
concreto da Cisjordânia. Esse muro acompanha a linha do armistício
de 1949, engolindo, na passagem, muitas áreas plantáveis de terras
palestinas, rasgando ao meio vilas e comunidades e separando
sitiantes e agricultores de suas plantações de oliveiras.
Como sobre outros 18
muros e barreiras, o regime sionista diz que se trata de simples
medida de segurança. Mas, para muitos, o muro marca o limite de um
futuro estado palestino, e já consumiu mais 12% do território da
Cisjordânia. Cerca de dois terços dos quase 748km de muro já estão
prontos, quase todo ele uma barreira de aço, com largas faixas de
exclusão dos dois lados. Segundo o traçado atual, 8,5% do
território da Cisjordânia e 27.520 palestinos vivem do lado
‘israelense’ da barreira. Outros 3,4% da área (com 247.800
habitantes) está completamente ou parcialmente já cercada pelo
muro.
Duas outras barreiras
semelhantes – a que separa Israel e a Faixa de Gaza; e o muro que
Israel construiu, 7-9m, que separa Gaza do Egito (que foi
temporariamente derrubado dia 23/1/2008), atualmente sob controle dos
egípcios –, também têm sido amplamente criticadas pela
comunidade internacional.
De volta ao tema do
novo projeto de novo muro, cada vez mais o regime sionista dedica-se
a impedir discussões, audiências, visitas, expressões de
solidariedade com os palestinos; agora já tenta impedir, até, que,
do sul do Líbano, se aviste o estado sionista militar. O movimento
de impedir que se veja e reveja uma paisagem que há milênios
fascina os viajantes é mais um passo na direção do autoisolamento
de Israel, cada vez mais xenófobo.
Depois da reunião
conjunta em Kfar Kila, o major-general Serra, da UNIFIL, disse:
“A reunião foi
convocada para ajudar Israel a implantar medidas adicionais de
segurança ao longo da Linha Azul, na área de Kfar Kila, para
minimizar as causas de tensões esporádicas ou de desentendimentos
que poderiam levar a uma escalada da situação”.
O mais provável, de
fato, é que o muro em Kfar Kila provoque efeito exatamente oposto.
Em recente visita ao
campo palestino de Ahmad Jibril no vale do Bekaa, e em conversa com
grupos salafistas em Saida, pude ver bem claramente que o muro logo
virará alvo para prática de tiro; o que só dificultará o trabalho
da UNIFIL e do Hezbollah, que tanto se esforçam para manter calma a
região de fronteira.
Em comentário
sarcástico, recentemente publicado em Yedioth Ahronoth, o jornal de
maior circulação em Israel, Alex Fishman, conhecido analista da
Defesa, escreveu:
“[Israel] Nos
tornamos uma nação que se autoaprisiona atrás de muros e cercas,
que se encolhe aterrorizada por trás de escudos de defesa”.
Já é, disse Fishman,
“uma doença mental nacional.”
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