domingo, 24 de junho de 2012

Heleny Guariba

buscado no MST


Quando o golpe de 1964 instaurou a ditadura militar no Brasil, mulheres e homens amargaram nas prisões de delegacias e aparelhos clandestinos de repressão, sofrendo as mais desumanas torturas físicas e psicológicas. Com o poder nas mãos dos militares, muitas destas pessoas foram exiladas e deixaram o país. Outras ficaram, para lutar das mais variadas formas para reconquistar a liberdade e a democracia do Brasil. O ideal era o mesmo, mas as formas de luta variavam: alguns decidiram pegar em armas, através das guerrilhas, outros escolheram a arte. Dentre aqueles que optaram por este instrumento está a diretora teatral Heleny Guariba, que junto com outros nomes desconhecidos pela maioria dos brasileiros, contribuiu para semear o ideal de liberdade e de justiça em um período crítico da história nacional.
Heleny Ferreira Telles Guariba nasceu em Bebedouro, interior de São Paulo, em 1941 e se criou numa família essencialmente feminina. Orfã de pai, aos 2 anos de idade, foi criada pela mãe, pela avó e por uma tia. Filha única e centro das atenções de sua família, a pequena Heleny encantava a todos com seu jeito gentil e falante. Ainda adolescente, começou a dar aulas para crianças e jovens na Escola Dominical da Igreja Metodista Central , em São Paulo, cidade para onde sua família seguiu depois da morte de seu pai. Nesta escola, desenvolveu uma de suas características mais marcantes: saber ensinar e ouvir com interesse e respeito a consideração do outro.
Estudos no exterior
Em 1965, um ano depois de se formar na Faculdade de Filosofia da USP, Heleny parte para a Europa para estudar teatro, política e artes. Na Alemanha, frequentou o teatro do dramaturgo alemão Bertolt Brecht, o Berlinder Ensemble. Já na França, a diretora fez seu doutorado, além de estágios em diversos teatros do país, como o Theatre de la Cité, de Roger Planchon, também discípulo do teatro idealizado por Brecht.
Na volta ao Brasil, Heleny queria colocar em prárica tudo aquilo que tinha aprendido, visto e sentido na sua temporada no exterior. Para colocar seus ideais revolucionários de transformação política e de resgate da liberdade de expressão em prática, ela usou o teatro como instrumento. Passou a dar aulas na Escola de Artes Dramáticas da USP, onde seu objetivo de popularizá-lo ganhou força entre seus alunos. Assim como Brecht, Heleny queria fazer um teatro operário, que pudesse agir como ferramenta de conscientização política. Assim, foi em Santo André, no ABC paulista, que ela encontrou o campo favorável para isso. Na década de 60, a instalação de diversas fábricas faziam com que a cidade tivesse uma forte concentração de trabalhadoras e trabalhadores, além de uma grande representatividade estudantil, o que tornava o contexto perfeito para o trabalho de Heleny.
Foi então que em 1968, a diretora fundou o grupo Teatro da Cidade, formado em sua grande maioria por operários. A primeira montagem do grupo, Jorge Dandin, o Marido Traído, do dramaturgo francês Moliére, foi vista por mais de 7 mil pessoas. Em 1969, o grupo montou A Ópera dos Três Vintens, de Bertolt Brecht, um dos autores preferidos de Heleny, por causa de sua intensa veia social.
O grupo tinha a alma de Helleny, que através de seu teatro popular buscava a intensificação do envolvimento político dos trabalhadores no contexto social pelo qual o Brasil passava. Mas sua história com o teatro ultrapassou as fronteiras de Santo André. Além das aulas na EAD, Heleny trabalhou com Augusto Boal, dando aulas no seminário de dramaturgia do Teatro de Arena, criado pelo diretor, A diretora também escreveu diversos artigos, publicados em jornais dos anos 60.
Censura dos militares cala a voz de Heleny
Tanto envolvimento político provocou a ira dos militares da ditadura que não toleravam nenhuma iniciativa de transformação no pensamento dos brasileiros. Em março de 1971, Heleny foi presa pelo Dops (Departamento Estadual de Ordem Política e Social), sendo torturada por dois meses. Foi solta, mas detida novamente em julho do mesmo ano e enviada ao Destacamento de Operações de Informações, no Rio de Janeiro. Testemunhas afirmam que ela sofreu torturas por três dias e que foi assassinada na ''casa da morte'', em Petrópolis, um dos aparelhos clandestinos de repressão da ditadura. Depois disso, Heleny ingressou na extensa lista dos desaparecidos políticos da ditadura militar. A artista deixou dois filhos: João Vicente e Francisco.
Todos que conviveram com ela têm como lembrança a imagem de uma pessoa companheira e sempre pronta para enfrentar situações difíceis. ''De jeito alegre e cativante, pequena, arisca e bonita - beleza que a gente percebe que vem de dentro pra fora, enraizada no espírito ágil que lhe conservava, no corpo, o jeito de menina'', disse Frei Betto sobre Heleny. Uma brava guerreira, que apesar de permanecer no quase anonimato para a grande maioria dos brasileiros deixou sua marca na história recente do Brasil, como um exemplo de fibra, coragem e perseverança. Heleny provou que não importa de que maneira, o importante é lutar por mudanças.

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