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Por Carlos Henrique Machado Freitas
“Todo artista brasileiro que, no momento atual, fizer arte
brasileira, é um ser eficiente com valor humano. O que fizer arte
internacional ou estrangeira, se não for um gênio, é um inútil, um nulo.
É uma reverendíssima besta.”
(Mário de Andrade).
O critério estabelecido, melhor, conduzido pelo padrão do mercado
necessitou fabricar, por meio de publicidade e de um patrulhamento
regulado pelos interesses transnacionais, que os países deveriam
obedecer à agenda de investimento das multinacionais como uma nova
hierarquia estética. A partir daí a deformação empregada nas novas
relações, a ideia de mercado internacional em relações pontuais criou em
uma parcela ínfima da sociedade brasileira o reduzido pensamento de
homem universal tal como o modelo da globalização tinha como padrão.
O abandono da própria imagem social por uma outra “redescoberta”
fundada pelos interesses econômicos, a partir da metade do século
passado, manteve implacáveis e radicais racionalidades exigindo uma
flexibilização tropical para a adaptabilidade de uma nova ordem
econômica nas relações empresariais da cultura. E é dessas combinações,
segundo a fórmula sugerida pelo poder hegemônico global, que todo um
processo cheio de circunstâncias fabricadas impôs uma constituição do
espaço geográfico das instituições brasileiras. Isso, em certa medida,
dificultou as relações interpessoais, dentro do Brasil, desestimulou a
solidariedade social entre os indivíduos e a sociedade, e entre esta e o
Estado.
Falida esta onda globalitária – conceito empregado por Milton Santos –
este modelo não tem mais razão de ser. E é o próprio Milton Santos que
nos dá uma ideia clara do que ele chama de “a centralidade periférica”.
“A ideia da irreversibilidade da globalização atual é
aparentemente reforçada cada vez que constatamos a inter-relação atual
entre cada país e o que chamamos de “mundo”, assim como a
interdependência, hoje indiscutível, entre a história geral e as
histórias particulares. Na verdade, isso também tem a ver com a ideia
também estabelecida, de que a história seria sempre feita a partir dos
países centrais, isto é, da Europa e dos Estados Unidos, aos quais, de
modo geral, o presente estado de coisas interessa.” (Milton Santos).
O Brasil vive um momento histórico em que as liberdades aparecem em
cada passo e compasso das manifestações da sociedade. Isso torna o
Brasil uma nova fonte de riqueza aproveitando essas novas possibilidades
para que um maior número de cidadãos discuta a sua realidade e assuma
um quinhão de responsabilidade na execução de um novo país.
O governo tem cumprido uma agenda majoritária seguindo de forma
considerável as próprias correntes populares, introduzindo um ritmo novo
nas relações nacionais e internacionais, mantendo livres os movimentos
da sociedade para que eles determinem como tornar cada ponto específico
de suas escolhas em realidade na atual gestão do governo Dilma, assim
como foi no governo Lula.
Há, no entanto, dentro do MinC, uma peculiaridade anti-nacional feita
por uma falsa leitura de timbração europeia que importa conceitos de
desnacionalização de nossa cultura para aplicar um vocabulário
economicista sem condições de sair da própria vulgarização do termo,
mercado cultural global.
Então, o Ministério da Cultura celebra um projeto hegemônico limitado
à globalização cultural para tentar se constituir em uma nova promessa
de reformulação da ordem mundial. Isso significa que, depois de oito
anos de avanço do governo Lula, nós da cultura deixamos de discutir um
elenco de políticas sociais para nos jogarmos aos níveis inferiores de
uma governança global em que o fator nacional é deixado de lado para,
num retrocesso retumbante, tentar jogar a sociedade numa visão de mundo,
uma espécie de volta à velha noção do status quo.
O Ministério da Cultura tenta de forma impossível construir um
discurso de liberação do artista brasileiro censurando toda a base
intelectual e política embutida nos processos que orientam a nossa
criação. Com isso, além de ampliar, via relações culturais, uma
histórica dívida social marginalizando e renegando a função inserida na
base da sociedade, o MinC tenta colocar a mesma a serviço de uma nova
etapa de consumo ambicionado por um bloco mecânico que é difundido no
mundo a partir de um cenário econômico que estabeleça um mercado via
empresas e devolva a cultura à competitividade sempre buscando o
mercado.
Ocorre que o Estado, assim como o atual mercado, não tem mais um
estatuto político que imponha mais os elementos fundamentais de uma
técnica hegemônica. A presença do cidadão a partir das novas
tecnologias, criou novos movimentos sociais, novos símbolos de baixo
para cima. Tudo isso somado, é produto da cultura popular e é ela a
portadora de uma nova verdade da existência do homem no planeta e,
portanto, a cada dia é revelado pelo próprio movimento uma nova forma de
ação.
Mas parece que essa tendência crescente de aglomeração popular que,
assim como no Brasil, está presente em variados pontos do planeta, não é
identificada pelo Ministério da cultura. Talvez por comodidade ou por
uma pretensão vinda de uma força anti-nacional que falsifica o sentido
do Ministério da Cultura do Brasil.
É nítido que o Ministério da Cultura não tem coragem de ser
brasileiro. Por isso busca e rebusca um discurso pitoresco em torno da
pira econômica para tentar se fazer perceber diante da fraqueza crua da
tônica da chamada indústria criativa. E o resultado não é outro, estamos
diante de um ministério socialmente primitivo, economicamente perdido e
conceitualmente falido.
Carlos Henrique Machado Freitas é músico, compositor e bandolinista.
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