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Um diagrama do capitalismo
cognitivo e da exploração da inteligência social geral
[8] FOUCAULT, Michel, Surveiller et punir. Naissance de la prison (Paris, Gallimard, 1975); ing. Discipline and Punish: The birth of the prison (New York: Pantheon, 1977), port. Vigiar e punir: nascimento da prisão, Petrópolis: Vozes, trad. Raquel Ramalhete, 1987.
[9] Ver nota 5
[20] Ver FLORIDA, Richard, The Rise of the Creative Class: And How It’s Transforming Work, Leisure, Community and Everyday Life (New York: Basic Books, 2002).
[22] NEGRI, Antonio e VERCELLONE, Carlo, “Il rapporto capitale/lavoro nel capitalismo cognitivo”, in Posse, “La classe a venire”, Nov. 2007.
16/3/2010, Matteo
Pasquinelli: Google’s PageRank Algorithm: A Diagram of the Cognitive
Capitalism and the Rentier of the Common Intellect - publicado in BECKER, Konrad, STALDER, Felix (eds), Deep
Search, London: Transaction Publishers, 2009 (com tradução para o alemão, o
italiano e o japonês)
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
“No coração [da
empresa Google] está o algoritmo de PageRank que Brin e Page escreveram
quando ainda estudantes de graduação em Stanford nos anos 1990. Perceberam que
cada vez que uma pessoa que tenha página na web linka sua página a outra, está
manifestando um julgamento. Está declarando que considera importante a outra
página. Perceberam também que, se cada link da web contém uma pequena porção de
inteligência humana, todos os links
combinados contém grande quantidade de inteligência – muito mais, de fato, que
qualquer mente humana poderia conter. O motor Google de busca reúne essa
inteligência, link a link, e usa o resultado para determinar
a importância de cada uma e de todas as páginas que há na web. Quanto maior o número de links que levam a uma página, maior o
valor da página. Nas palavras de John Markoff, o programa de Google “explora
sistematicamente o conhecimento humano e as decisões humanas sobre o que é
significativo”. Cada vez que escrevemos um link ou clicamos num link, estamos alimentando o programa
Google com nossa própria inteligência. Estamos tornando a máquina um pouco mais
inteligente – e, simultaneamente, estamos tornando Brin, Page todos os
acionistas da empresa Google um pouco mais ricos” (Nicholas Carr, The Big Switch) [1].
Resumo
Matteo Pasquinelli |
A origem do
poder e do monopólio da empresa Google deve ser buscada no algoritmo PageRank, invisível. O diagrama dessa
tecnologia é exposto aqui como a mais perfeita descrição de máquina de valor no
coração do que tem sido denominado “economia da atenção” ou “capitalismo do
conhecimento” [dito “cognitivo” [I]]. Esse ensaio destaca a
necessidade de que se construa uma economia política do algoritmo PageRank, em vez de continuar a expandir
a crítica dominante, contra o monopólio da empresa Google, baseada no modelo do
Panopticon ou de equivalentes de
algum “Big Brother” (questões de datavigilância, privacidade, censura
política). O poder da empresa Google é visto aqui, antes de tudo, da perspectiva
da produção de valor (em diferentes formas: valor de atenção, valor de
conhecimento, valor de rede, etc.): as consequências biopolíticas do uso que a
empresa faz dos dados de que se apropria e que acumula são posteriores, no plano
lógico.
_________________________________________________________
Nesse
ensaio, oferecem-se três principais argumentos sobre a “economia Google”,
considerando respectivamente: a produção de valor, a acumulação de valor e a
reapropriação de valor.
Primeiro,
o PageRank da Google é apresentado
como a melhor implementação do diagrama do capitalismo cognitivo. Esse diagrama
cognitivo e econômico inverte, de fato, o diagrama do Panopticon de linhagem
Foucauldiana: não é simplesmente aparelho de vigilância e controle, mas também
uma máquina para capturar tempo e trabalho vivos e transformar a inteligência
geral social em valor de rede. A Datavigilância só tornada possível,
portanto, graças exclusivamente a um monopólio de dados que já foram previamente
acumulados mediante o algoritmo de PageRank.
Segundo,
esse modelo de hegemonia cognitiva exige que se compreenda uma nova teoria da
exploração do conhecimento, baseada na exploração de uma nova paisagem da mídia
a favor de uma inteligência pressupostamente coletiva, que só aparentemente é
livre e aberta. A empresa Google é aqui definida como parasita do contexto
digital: de um lado, oferece serviços beneficentes gratuitos; de outro lado,
acumula valor numa plataforma pervasiva de publicidade para a web
(Adsense e Adwords).
Mais
importante: a empresa Google estabelece sua própria hierarquia proprietária de
valor para cada node da internet e, assim, torna-se a primeira empresa
rentista global sistemática a viver da exploração da inteligência geral social.
Terceiro,
só será possível conceitualizar e organizar uma resposta política, se se
inverter a cadeia de produção de valor (em outras palavras: “Cobre pelo seu
page rank!”), em vez de tantos se consumirem em resistência só nominal
contra algum “Panopticon digital”.
Parte considerável dos recentes
estudos críticos sobre a empresa Google concentram-se quase exclusivamente na
natureza imperial do monopólio, quer dizer: na posição dominante da empresa
comercial, nas questões de invasão de privacidade, na censura política (sempre
contra a China) e no aparelho global de datavigilância. [2] São raros os estudos sobre o motor
econômico molecular que opera no coração daquela dominação.
Enquanto tantos estudos críticos
abusam da terminologia Foucauldiana e
forçam os modelos para visualizar alguma espécie de Panopticon digital que
descreveria a empresa Google, mais importante é fazer ver que o poder da
empresa, nesse caso, está oculto na matriz econômica que se conhece sob o
nome-código cabalístico de PageRank —
o sofisticado algoritmo que avalia e determina a importância de uma
webpage e sua posição hierárquica no conjunto dos resultados do motor de
busca. [3]
Como
se demonstra nos parágrafos seguintes, o mecanismo conhecido como PageRank opera de modo que pode ser
intuitivamente compreendido sem dificuldade; mas ainda não se tem, construída,
uma “economia política” desse aparelho.
Embora
muito se discuta a dimensão biopolítica da empresa Google (discussão articulada,
quase sempre, na terminologia pós-estruturalista já citada), ainda falta
qualquer análise bioeconômica que explique como a empresa Google extrai valor de
nossa própria vida e converte a inteligência geral social em riqueza e valor de
rede dos quais a empresa apropria-se. À parte a preocupação legítima, há o abuso
de um paradigma Foucauldiano, para mostrar só um lado do problema; o poder na
empresa Google não é alguma espécie de entidade metafísica; ele brota da
plataforma tecnológica e do modelo de negócio da empresa.
Como diz Paolo Virno, para
realmente compreender o que é a biopolítica, temos de começar por compreender a
potencialidade de nossos próprios corpos vivos e de nosso próprio trabalho vivo:
as estruturas biopolíticas vêm depois, como aparelho para capturar essa
potencialidade. [4]
É
preciso inverter a metáfora do Panopticon: a empresa Google não é simplesmente
um aparelho de datavigilância que
desce sobre nós, vindo de cima para baixo; ela é, também, um aparelho que produz
valor de baixo para cima. Dito claramente: a empresa Google produz e acumula
valor mediante o algoritmo conhecido como PageRank, pelo qual a nossa inteligência
social geral é posta numa escala proprietária de valores. Aí está a questão
crucial, o cerne duro do problema.
A
economia política de Google
Inc. tem de começar pela economia política de PageRank
O PageRank da empresa Google foi
apresentado pela primeira vez por Sergey Brin e Lawrence Page, em artigo de
1998, “The Anatomy of a Large-Scale Hypertextual Web Search Engine” [Anatomia de
um motor de busca hipetextual de larga escala para a Web]. [5] O algoritmo chamado PageRank produziu uma revolução nas
tecnologias de recuperação de informação [or. Information Retrieval, IR]
e no panorama de motores de busca que se conhecia no final dos anos 90s. Pela
primeira vez, o oceano aparentemente imóvel dos dados que circulam pela Internet
foi classificado e os dados foram distribuídos, pela empresa Google, em
hierarquias dinâmicas, conforme a visibilidade e a importância de cada página
[orig. website].
Esse
rankeamento das páginas da web pode ser entendido intuitivamente: o valor
de cada página é determinado pelo número e pela qualidade dos links que
procuram cada página. Um link que chegue, vindo de um endereço que esteja
classificado no topo da lista das páginas rankeadas, vale mais que um
link que chegue, vindo de página classificada na região inferior da lista das
páginas rankeadas.
Enquanto,
nos final dos anos 1990s, motores de busca (como o da empresa Yahoo) ainda
classificavam à mão as páginas da web, para organizá-las em estrutura de
árvore, típica da estrutura do conhecimento enciclopédico, a empresa Google
apareceu com uma fórmula para localizar e atribuir um valor semântico a qualquer
hipertexto, por dinâmico e caótico que fosse. PageRank começou por descrever as
páginas da web segundo a popularidade
de cada página, e o motor de busca devolvia uma hierarquia de resultados,
conforme o critério de rankeamento
então usado.
Além das árvores do conhecimento
(da empresa Yahoo) e dos rankings (da empresa Google), há outras técnicas
para Recuperação de Informação, e outras serão desenvolvidas no futuro. [6] O programa e a fórmula matemática
do algoritmo do PageRank são,
considerados em si, um constructo altamente complexo só acessível a matemáticos
profissionais treinados: aqui, são oferecidos num nível acessível de
compreensão, para que se possa tentar uma primeira análise política desse
aparelho.
[7]
O diagrama acima, de
PageRank, está na página da Wikipedia desde 2009 e foi incluído no texto original do
artigo.
Em 2012, na mesma página, vê-se outra figura para
ilustrar o mesmo conceito, muito mais ‘simpática’, extraída “do Fã Clube do
Google”:
Nem uma nem outra dessas imagens
tem qualquer semelhança com a estrutura centralizada do Panopticon descrito por
Foucault em Vigiar e Punir.
[8]
A natureza líquida e hipertextual
da rede (e, em termos mais gerais, da noosfera) tem de ser ilustrada de outro
modo.
Pode-se
traçar intuitivamente um diagrama do capitalismo do conhecimento – na estrutura
de um hipertexto – cada link simétrico substituído por um vetor
assimétrico de energia, dados, atenção ou valor. O que PageRank desvela e afere precisamente é
essa constituição assimétrica de todos os hipertextos e
redes.
A
fonte de inspiração para criar PageRank foi o sistema acadêmico de
citações e referências. O “valor” de uma publicação acadêmica é, como se sabe,
calculado de modo muito matemático, conforme o número de citações que um artigo
receba em outros artigos.
Consequentemente, a classificação geral [orig. ranking]
de um artigo ou publicação acadêmica é a soma de todas as citações que o artigo
ou publicação tenha recebido. Como explicam Brin e Page:
Aplicou-se à rede a literatura de
citações acadêmicas, em boa parte contando as citações de, ou os links para, uma
determinada página. Tem-se assim boa aproximação da importância ou qualidade de
uma página. PageRank estende essa
ideia; mas não conta os links de todas as páginas como se fossem equivalentes e,
sim, atribui peso ao número de links que cada página receba. [9]
Essa
genealogia “livresca” de PageRank não
deve ser subestimada. Pode-se aplicar modo similar de descrever o valor a
qualquer objeto de conhecimento [“cognitivo”]; e é modo genealogicamente
equivalente à “sociedade do espetáculo” e àquela economia selvagem de marcas.
Num regime de espetáculo, o valor de uma mercadoria é produzido, principalmente,
por uma condensação de atenção e desejo coletivo, dirigido pelos meios de
comunicação e publicidade de massa. Das publicações acadêmicas às marcas
comerciais e à internet, que se auto- avalia e auto-rankeia-se, pode-se
em todos os casos assumir que haja processos equivalentes de condensação de
valor.
Como
a colonização digital deu presença online a toda e qualquer entidade
offline, essa matriz de relações sociais e de valor migrou para o mundo
online e tornou-se digitalmente rastreável e mensurável pelos motores de
busca. PageRank descreve
especificamente o valor de atenção de qualquer objeto, a tal ponto que se tornou
a principal e mais importante fonte de visibilidade e autoridade, mesmo fora da
esfera digital. PageRank oferece uma
fórmula de acumulação de valor que é dominante e compatível, em vários
diferentes domínios midiáticos: é um diagrama que efetivamente descreve em geral
a economia da atenção e a economia do
conhecimento.
A noção de economia da atenção é
útil para descrever o modo pelo qual (parte do) valor de uma mercadoria é
produzido hoje mediante a acumulação de desejo (dirigido pela mídia) e de
inteligência.
[10]
Quanto à constituição desse valor,
outras escolas de pensamento falarão de “capital cultural” (Pierre
Bourdieu), [11] “capital coletivo simbólico”
(David Harvey), [12] ou de inteligência geral social
[orig. general intellect] (especialmente na tradição do
pós-Operaismo, com mais atenção aos traços de saberes, de conhecimento
[“cognitivos”]. Antes da internet, esse processo era descrito como movimento
coletivo difuso. Depois da internet, a estrutura das relações de rede em torno
de um determinado objeto pôde ser facilmente traçada e mensurada. PageRank é a primeira fórmula matemática
que permitiu calcular o valor de atenção de cada node numa rede complexa
e o capital de atenção geral de toda a rede.
Qual
é a natureza do valor medido por PageRank? Muito interessante ver que
cada linkagem e cada vetor de atenção não são simplesmente gestos
instintuais, mas são concretizamentos de inteligência, e, muitas vezes, são atos
conscientes. Se “está na moda”, hoje, descrever a sociedade em rede como uma
conurbação de fluxos desejantes, ainda assim esses fluxos são densos de saberes
e de conhecimento e participam também da atividade de uma inteligência social
geral comum de todos.
Na citação que aparece na
introdução desse artigo, Nicholas Carr descreveu muito bem o modo como trabalha
o PageRank da empresa Google, como
alimenta-se de nossa inteligência coletiva e como o valor produzido e acumulado
é extraído desse intelecto comum. PageRank assim estabelece sua própria
economia da atenção, mas grande parte desse capital de atenção é, mais
precisamente, construído de capital intelectual, dado que cada link
[elo/enlace/ligação] que alguém crie manifesta um concretizamento de
inteligência, de saberes. Nesse sentido, a empresa Google é um aparelho
parasitário de captura do valor produzido pela inteligência social geral comum
de todos.
[13]
A
teoria das redes poderia existir sem alguma noção de valor de rede – uma noção
de valor que seja específica do ecossistema e da economia da rede? Vasculhando a
densa massa de conhecimento e saberes que circula da internet, PageRank é, precisamente, um mecanismo
responsável por atribuir um valor que permite classificar, uns em relação aos
outros, cada node da rede e construir um ranking. Esse valor de
relação aferido pela empresa Google é reconhecido extraoficialmente como a moeda
da economia global da atenção; e influencia, de modo crucial, a visibilidade
online de indivíduos e empresas e, assim, também o prestígio e preços de
comercialização e business de indivíduos e empresas. Esse valor de
atenção é, em seguida e de diferentes modos, convertido em valor monetário.
Se o algoritmo PageRank ocupa o núcleo mais duro da
empresa Google como matriz dominante, o dinheiro lhe chega pela plataforma Adwords, de venda de publicidade, que
explora a posição dominante da empresa (99% das entradas chegam à empresa Google
pela venda de publicidade, segundo o Relatório Anual 2008).
[14] O algoritmo PageRank, “mais” os gigantescos centros
de dados (que trabalham 24 horas/dia, ininterruptamente indexando a rede),
garantem uma posição de monopólio aos canais de publicidade da empresa Google.
O
modo pelo qual a empresa Google gera valor merece análise mais atenta. Ao
contrário dos veículos tradicionais de comunicação de massa, a empresa Google
não produz qualquer tipo de conteúdo. Claramente, a Google captura o pensamento
de milhões de websites e de usuários, graças ao seu programa de venda e
distribuição de publicidade, o Adsense. O Adsense da empresa Google garante uma
infraestrutura leve para a publicidade que penetra, que se infiltra, por cada
interstício da rede, como parasita sutil e monodimensional, extraindo lucro, sem
produzir qualquer conteúdo.
O
dinheiro entra no ciclo em Adwords e
daí é distribuído por Adsense para
blogueiros individuais ou empresas que operam pela rede. Na economia da
internet, tanto o tráfego de uma página como a redistribuição do valor são hoje
amplamente governados por PageRank.
PageRank está no coração da economia
da atenção da internet, como está também no cerne de uma economia geral do
prestígio que afeta muitos outros domínios controlados direta ou indiretamente
pela empresa Google (considerem-se, por exemplo, a Academia e Google Scholar; a indústria da música e
YouTube, etc. – e são muitos os casos
de simbiose entre a internet e o show business).
O que PageRank faz é identificar e mensurar o
valor de rede, de forma absolutamente numérica. Se, tradicionalmente, se
descrevia uma mercadoria pelo valor de uso e pelo valor de troca, o valor de
rede é outra camada que se acrescentou àquelas duas, para descrever relações
chamadas “sociais”. Para muitos, a expressão, usada nesse quadro, é ambígua,
porque parece apontar simplesmente para um “valor de redes” (como a muito
celebrada “riqueza de redes” de Benkler). [15]
Para ser mais preciso, é preciso
introduzir e articular aqui uma nova noção de mais-valia da rede. [16] De fato, PageRank produz o que Deleuze e Guattari
descreveram como um valor de mais-valia maquínico, que se refere à mais-valia
acumulada em todo o domínio cibernético, que é a transformação de um valor de
mais-valia do código, em uma mais-valia do fluxo. [17] Com PageRank, a empresa Google não
conquistou simplesmente uma posição dominante no armazenamento de indexes
de rede: conquistou também o monopólio da produção desse valor de rede.
O
diagrama de PageRank chama a atenção
para um importante aspecto da relação entre dois nodes de qualquer rede.
Essa relação jamais é puramente simétrica, mas assimétrica: cada link
anda só numa direção, como uma flecha, cada link representa um
intercâmbio de desejo, atenção, saberes e conhecimento que jamais é simétrica. A
relação jamais é binária e igual; de fato, é ternária, dado que sempre há um
terceiro node que a influencia e, assim, há um acúmulo de valor absorvido
para outra direção. Nenhuma rede jamais é plana e horizontal.
A
ontologia digital é sempre influenciada por valores e redes materiais externos,
pelo mundo análogo do trabalho e da vida (que é a influência dos campos da
biopolítica e da bioeconomia).
Nenhuma
rede jamais é simétrica e homogênea; é uma superfície topológica eriçada de
vórtices moleculares. Entre as hierarquias verticais do conhecimento tradicional
e as – tão celebradas – redes horizontais da produção de conhecimento de hoje, a
dimensão vortical [dos vórtices] mostra como os dois eixos estão sempre
conectados e como hierarquias dinâmicas continuam a nos seguir também para o
reino digital. O PageRank da empresa
Google instalou-se precisamente nesse movimento que modela a esfera coletiva do
conhecimento e a internet em vórtices moleculares de valor.
Unindo num único objeto teórico (a) a topologia semântica de PageRank,
(b) a acumulação vortical de valor
que afeta as redes e (c) a noção de
mais-valia maquínica, podemos começar a esboçar um novo diagrama da economia do
conhecimento, ou, mais precisamente, do capitalismo do conhecimento (no qual
aparece autoevidente a dimensão capitalista da empresa Google). [18]
Nos
parágrafos acima, tentei mostrar como o valor é produzido coletivamente dentro
das redes digitais, e depois capturado pela fábrica imaterial da empresa Google
Inc. Uma vez introduzidos à questão da produção do valor de conhecimento, é
importante esclarecer os estágios e modos pelos quais é acumulado. O estudo do
caso Google ajuda a iluminar a questão mais geral de como o capitalismo do
conhecimento extrai mais-valia e “faz dinheiro”.
Para
entender a economia do conhecimento de hoje, e as indústrias culturais, também é
importante distinguir entre diferentes modelos de negócio e, sendo possível,
visualizar, não, simplesmente, uma tipologia, mas uma assemblage
maquínica de diferentes regimes de acumulação.
Numa visada básica, a economia do
conhecimento é atualmente descrita por dois paradigmas dominantes: de um lado,
exploração da propriedade intelectual; de outro lado, exploração do capital
cultural. A definição de Indústrias Criativas [II], por exemplo, sublinha a
“exploração da propriedade intelectual”, [19] enquanto a muito celebrada
‘economia criativa’ de Richard Florida é baseada de fato na exploração do
capital geral humano de uma dada cidade. [20] Assim também, o pós-Operaismo
italiano sublinhou a natureza produtiva da inteligência geral social dos
trabalhadores da indústria de ontem, e das multidões metropolitanas de
hoje. [21]
Nessas leituras, a produção
coletiva de conhecimento é sempre parasitada pelas corporações do capitalismo do
conhecimento, como, antes, as fábricas extraiam mais-valia do trabalho vivo dos
trabalhadores. Na direção oposta, abordagens como a noção de Benkler de
“produção social” ou de Lessig, de “cultura livre” celebram uma produção baseada
em redes, sem ver as dimensões da mais-valia (valor) e da mais-valia (trabalho).
Todas essas escolas devem responder a mesma pergunta: como a mais-valia é
extraída e acumulada na economia do conhecimento?
O
discurso crítico está de fato monopolizado pela ênfase na propriedade
intelectual e no conflito entre o regime global de copyright e os
movimentos anti-copyright. A própria empresa Google é, por sua vez, claro
exemplo de império tecnológico construído sem precisar da proteção de qualquer
regime estrito de copyrights. A
empresa Google apoia declaradamente o livre-conteudismo, liberdade total para os
conteúdos produzidos pelo trabalho livre das multidões livres da internet. Não
poderia ser diferente: a empresa precisa desse conteúdo livre, para manter sua
voraz indexação.
Nesse
cenário, é preciso mudar o foco político: das questões de propriedade
intelectual, é preciso passar afinal para a questão da exploração do
conhecimento, para entender como a mais-valia é extraída e acumulada na esfera
digital, a partir de serviços aparentemente gratuitos.
Atualmente,
já se entendem bem claramente os monopólios da propriedade intelectual. As
grandes gravadoras de música lutam hoje, precisamente, para defender esse
regime, contra o assalto das redes digitais. O regime já está descrito por
muitos, como exploração parasitária de propriedade intelectual [orig.
cognitive rent]: as empresas de mídia simplesmente exploram o
copyright de trabalhos que não têm virtualmente qualquer custo de
reprodução sob o atual regime tecnológico. A própria empresa Google funciona num
regime fortemente monopolizado, sem por isso ter de defender qualquer direito de
propriedade intelectual (exceto a patente do PageRank!). Assim sendo, que tipo de
exploração do conhecimento a empresa Google incorpora?
Além
de inverter o modelo do Panopticon, é preciso inverter também as interpretações
correntes sobre economia da rede e produção do valor de rede.
Nova compreensão do que seja e um
novo modelo de exploração apareceram recentemente no debate
pós-Operaismo. Carlo Vercellone e Antonio Negri, Christian Marazzi e
vários outros redescobriram a dimensão do “rentismo” como node crucial,
na deriva do capitalismo industrial para o capitalismo do
conhecimento.
[22]
O que sempre lembrou tanto o
Ancient Regime e seus feudais donos de terras, relíquia de uma economia
pré-industrial, hoje se reencarna nas formas do rentismo financeiro do
conhecimento [orig. financial and cognitive rent].
Na
teoria da economia clássica, o rentismo não se confunde com o lucro. “Renda” é
ganho parasitário que um proprietário aufere apenas por ser proprietário de um
bem, e é tradicionalmente associado à propriedade da terra. O lucro, por seu
lado, visa a ser produtivo e está associado ao poder do capital para gerar e
extrair mais-valia (da mercadoria e da força de trabalho).
Vercellone critica a ideia de que
haveria um “capitalismo produtivo bom”, destacando que o lucro se converte em
renda, e que esse seria a traço característico da atual economia financeira do
conhecimento.
[23] Vercellone, nesse sentido, criou
um slogan para ao capitalismo do conhecimento: “O neolucro é a renda”.
A
empresa Google pode, assim, ser descrita como o rentista global que está
explorando as novas terras da internet, sem precisar de garantias proprietárias
e sem precisar, tampouco, produzir coisa alguma, nem conteúdos. Nesse quadro, a
empresa Google aparece como puro rentista, na metadimensão da informação
acumulada pelas redes digitais. A empresa Google não é proprietária da
informação da internet: só é proprietária da mais rápida ferramenta para
recolher e mensurar a inteligência geral coletiva que produziu aquela
informação.
O
rentismo, assim, é melhor modelo para descrever a exploração da inteligência
geral social comum e o próprio comum (se lucro e salário estão mais ligados a
uma dimensão individual, e o renda a uma dimensão mais coletiva e social de
produção).
Essa
nova teoria da renda e do rentismo é útil para escapar da chamada “crítica da
nova mídia” que ainda não se mostrou capaz de identificar os eixos de produção e
exploração, no domínio digital. É necessária e urgente, portanto, uma taxonomia
das novas formas de rentismo e dos novos modelos de negócios.
Para
os próprios Negri e Vercellone, por exemplo, o eixo central da atribuição
contemporânea de valor é a “expropriação do comum, mediante o rentismo”. Segundo
eles (além de outros), isso explica a crescente pressão na direção de um regime
mais duro de propriedade intelectual: o copyright já é uma das evoluções
estratégicas do rentismo, para expropriar os comuns de cultura e reintroduzir,
artificialmente, uma nova escassez. A especulação, então, dirige-se na direção
da propriedade intelectual, forçando para cima o custo de bens de conhecimento
que, paradoxalmente, podem ser reproduzidos e copiados sem, virtualmente, custo
algum, praticamente gratuitos.
Mas o caso complexo da propriedade
intelectual tem de ser mais claramente iluminado, porque a renda não brota
necessariamente, nem simplesmente, de conhecimentos apropriados; também brota da
exploração de espaços de conhecimento completamente novos e virgens – o que a
empresa Google demonstra, em relação à internet. O diagrama PageRank parece sugerir uma espécie de
renda diferencial em espaços dinâmicos, que merece investigação mais cuidadosa.
[24]
Resposta
política que faça sentido, à neodominação pela empresa Google terá de basear-se
num sistema alternativo de ranking capaz de penetrar o monopólio da
economia da atenção e, também, o sistema de acumulação de valor controlado pela
empresa Google.
Essa produção monopolista de valor
de rede poderá ser, de algum modo, revertida? A primeira escolha seria imaginar
uma indexação voluntária coletiva feita à mão, de toda a rede, baseada num
protocolo aberto (alguma espécie de Wikipedia das relações de rede, descrita sob
uma ontologia FOAF). [25]
Mesmo assim, Google parece ser
invencível no campo da escala de seu poder computacional: seria comprar briga
tola e primitiva. Por outro lado, um algoritmo de código aberto, para rankeamento de páginas, não daria conta
da questão da acumulação de valor nem do monopólio. Não por acaso, a ideia de um
algoritmo OpenRank foi rapidamente
abandonada. [26]
A atração fatal que Google exerce
sobre as massas parece ser resultado mais do poder místico que a empresa tem
para atribuir valor espetacular a qualquer um e a qualquer coisa, que
consequência da precisão dos resultados.
Há rumores de que PageRank está para ser brevemente
substituído por um TrustRank, outro
algoritmo desenvolvido por pesquisadores da Stanford University e da empresa Yahoo,
para separar páginas “confiáveis” de páginas spam e criar uma espécie de
comunidade de confiança ou um novo pacto cibernético social na
internet. [27]
Nesse cenário, a vida diária e a
produção de redes sociais serão integradas de modo ainda mais profundo.
A luta contra a acumulação de
dados que PageRank faz lembra as
lutas sociais contra as formas tradicionais de monopólio e de acumulação de
capitais.
[28] Se nos servimos da ideia de Marx
sobre a inteligência social geral [orig. general intellect], temos de
imaginar também uma acumulação primitiva de conhecimento, na fonte da economia
digital. De qualquer modo, a crítica do modo atual do trabalho em rede não se
pode estabelecer simplesmente com a narrativa previsível das redes “do bem”,
contra os monopólios “do mal”.
Só
imaginaremos uma resposta política, se compreendermos com clareza a natureza do
dispositivo molecular que produz o valor de rede. Não será fácil –
sequer é garantido que seja possível – democratizar PageRank e a empresa Google. Por outro
lado, e é interessante, tampouco as novas escolas “da moda”, de cooperação
peer-to-peer [entre usuários] e da “produção social” baseada na internet
conseguirão representar proposta política decente, enquanto não encararem a
questão da produção e da acumulação da mais-valia de rede.
Notas de rodapé
[1] CARR, Nicholas, The Big Switch: Rewiring the
World, from Edison to Google (New York: W.W. Norton, 2008).
[2]
Ver ZIMMER, Michael, “The Gaze of the Perfect Search Engine: Google
as an Infrastructure of Dataveillance”, in SPINK, A. e ZIMMER M., Web Search:
Information Science and Knowledge Management, vol. 14, Berlin-Heidelberg:
Springer, 2008. E DUPONT, Benoît, “Hacking the Panopticon: Distributed Online
surveillance and Resistance”, in DEFLEM, Mathieu (ed.), Surveillance and
Governance: Sociology of Crime Law and Deviance, vol. 10, Emerald, Bingley,
2008. Ver
também a crítica oferecida pelo presidente da Biblioteca Nacional Francesa,
JEANNENEY, Jean-Noël, Quand Google défie l’Europe: plaidoyer pour un
sursaut, Paris: Mille et une Nuits, 2005.
[3] “Political economy in the digital age: introducing the notion of
cognitive rent (or, the accumulation of network-value)”.
[4]VIRNO, Paolo, A Grammar of the Multitude
(New York: Semiotexte 2004), pp. 81-84 [Gramática
da Multidão, em português]: “Em minha opinião, para compreender o cerne
racional do termo “biopolítica”, temos de começar com outro conceito, muito mais
complicado, de um ponto de vista filosófico: o conceito de força-de-trabalho.
[...] O que significa “força-de-trabalho”? Significa potencial para produzir.
“Potencial”, quer dizer, aptidão, capacidade, dynamis. Potencial
genérico, não determinado: aquele que não foi designado para um ou outro
específico tipo de trabalho, mas, mesmo assim, está sendo usado em qualquer
trabalho que esteja sendo realizado, na fabricação de uma porta de carro, na
colheita de peras, no atendimento de telemarketing em ‘meio-período’, ou numa
revisão de provas tipográficas. [...] Isso dito, falta enfrentar outra questão
crucial: o que é a vida, nos casos em que, como esse, é gerenciada e controlada?
A resposta é absolutamente clara: tem de ser assim porque a vida atua como
substrato de uma faculdade, de uma força de trabalho, que também é incorporada
na mercadoria. [...] Não se deve acreditar, portanto, que a biopolítica inclua,
nela mesma, como sua própria articulação distinta, a administração da força de
trabalho. Ao contrário: a biopolítica é mero efeito, uma reverberação, ou, de
fato, uma articulação daquele fato primário – histórico e filosófico – que
consiste na comercialização de potencial como tal.”
[5]Conclusão:
“Cobre pelo ranking de sua página!” (ou seja, pela reapropriação [do
valor de rede de sua página na Internet]). BRIN, Sergey e PAGE, Lawrence. “The Anatomy of a
Large-Scale Hypertextual Web Search Engine”,
1998.
[6] Ver LANGVILLE, Amy N. e MEYER, Carl D., Google’s PageRank and
Beyond: The Science of Search Engine Rankings, Princenton University Press,
2006. E BERRY. Michael W. and BROWNE, Murray, Understanding Search Engines:
Mathematical Modeling and Text Retrieval (Philadelphia: Society for
Industrial and Applied Mathematics, 1999).
[7]
A figura está em PageRank
(Wikipédia) visitada em
12/3/2009.
Em 6/5/2012, lê-se o seguinte (e a figura aparece muito mais amigável):
“PageRank™ é uma família de
algoritmos de análise de rede que dá pesos numéricos a cada elemento de uma
coleção de documentos hiperligados, como as páginas da Internet, com o propósito
de medir a sua importância nesse grupo, por meio de um motor de busca. O
algoritmo pode ser aplicado a qualquer coleção de objetos com ligações
recíprocas e referências. O peso numérico dado a cada elemento E é chamado
“PageRank de E” e anotado como PR(E). Suas propriedades são muito discutidas por
especialistas em optimização dos motores de busca (SEO, sigla
em inglês
para Search Engine Optimization). O processo do
PageRank™ foi patenteado pela Universidade de Stanford nos Estados Unidos da
América sob o número 6.285.999. Só o nome PageRank™ é marca registrada da
empresa Google Inc..
[8] FOUCAULT, Michel, Surveiller et punir. Naissance de la prison (Paris, Gallimard, 1975); ing. Discipline and Punish: The birth of the prison (New York: Pantheon, 1977), port. Vigiar e punir: nascimento da prisão, Petrópolis: Vozes, trad. Raquel Ramalhete, 1987.
[9] Ver nota 5
[10] SIMON, Herbert, “Designing Organizations for an Information-Rich
World”, in M. Greenberger (ed.), Computers, Communication, and the Public
Interest, Baltimore: JohnsHopkins Press, 1971. Ver também DAVENPORT, T. e
BECK, J., The Attention Economy: Understanding the New Currency of
Business, Harvard Business School Press, 2001.
[11] Cfr. BOURDIEU, Pierre, “The Forms of Capital”, in: RICHARDSON, J.G.,
Handbook for Theory and Research for the Sociology of Education,
Westport, CT: Greenwood Press, 1986. BOURDIEU,
P. “O capital social: notas provisórias”. In NOGUEIRA, M. A.; CATANI, A. (orgs.)
Escritos de Educação, 3ª ed., Petrópolis: Vozes, 2001,
pp.67-69.
[12] Cfr. HARVEY, David, “The art of rent: globabalization and the
commodification of culture”, chapter in: Spaces of Capital, New York: Routledge,
2001.
[13]
Esse modelo de captura do capital de rede de cada node e usuário
pode ser aplicado genericamente a toda a internet e também às redes sociais
(como Facebook e Myspace, nas quais o número mais importante é, precisamente, o
número de “amigos” mostrado em cada página pessoal).
[14]
“AdWords é o produto principal de publicidade de Google Inc. e principal fonte
de dinheiro para a empresa ($16,4 bilhões em 2007). AdWords oferece publicidade
pay-per-click (PPC) e publicidade orientada para páginas, de textos e
publicidade em banners. O programa AdWords prevê distribuição local,
nacional e internacional. As mensagens de publicidade em texto de Google são
necessariamente curtas, uma ou duas linhas de conteúdo.” (Em Wikipedia, “AdWords”, 11/3/2009) [Ver (III) e (IV), nas Notas dos
tradutores].
[15] BENKLER, Yochai, The Wealth of Networks: How Social Production
Transforms Markets and Freedom, New Haven: Yale University Press, 2006.
[16] Não
se deve confundir esse “valor de rede” com a definição tradicional: pela lei de
Metcalfe do “valor de rede”, o valor de uma rede de telecomunicações é
proporcional ao quadrado do número de usuários do sistema conectados (n2).
[17] DELEUZE,
Gilles e GUATTARI, Félix, L’Anti-Oedipe. Capitalisme et schizophrénie (Paris: Minuit, 1972); ing. Anti-Oedipus: Capitalism and
Schizophrenia (Minneapolis: University of Minnesota Press, 1983); port.
DELEUZE,
G. & GUATTARI, F. (1972). O
Anti- Édipo: capitalismo e esquizofrenia. Trad. Joana M. Varela e
Manuel M. Carrilho. Assírio & Alvim: Lisboa, Portugal.
[18]
Para outros modelos de economia do conhecimento [orig. knowledge economy]
ver RULLANI, Enzo, Economia della conoscenza: Creatività e valore nel
capitalismo delle reti, Milano: Carocci, 2004.
[19]
Originalmente, a definição de 1998 adotada pela Força Tarefa das Indústrias
Criativas [orig. Creative Industries Task Force] instituída por Tony
Blair rezava: “Aquelas indústrias que têm origem na criatividade, habilidade e
talento individuais e que tem potencial para criar riqueza e empregos na geração
e exploração da propriedade intelectual.”
[20] Ver FLORIDA, Richard, The Rise of the Creative Class: And How It’s Transforming Work, Leisure, Community and Everyday Life (New York: Basic Books, 2002).
[21]
Ver VIRNO, Paolo, 2004, Op.cit. nota 4.
[22] NEGRI, Antonio e VERCELLONE, Carlo, “Il rapporto capitale/lavoro nel capitalismo cognitivo”, in Posse, “La classe a venire”, Nov. 2007.
[23] As Vercellone explains in a previous study: “According to a
widespread opinion in Marxian theory that stems from Ricardo’s political
economy, rent is a pre-capitalist inheritance and an obstacle to the progressive
movement of capital’s accumulation. On this premise, real, pure, and efficient
capitalism is capitalism with no rent.” In: Carlo Vercellone, “La nuova
articolazione salario, rendita, profitto nel capitalismo cognitivo”, in Posse,
“Potere Precario”, 2006; trans. by Arianna Bove, “The new articulation of wages,
rent and profit in cognitive capitalism”.
[24] Ver minha taxonomia do rentismo em PASQUINELLI,
Matteo, Animal Spirits: A Bestiary of the Commons
(Rotterdam: NAi Publishers/Institute of Network Cultures, 2008).
[25] FOAF
(em inglês, sigla de Friend of a Friend, “amigo de um
amigo”) uma ontologia que pode ser lida por máquina, que descreve pessoas,
atividades e relações com outras pessoas e objetos. Qualquer um pode usar FOAF
para se autodescrever. FOAF permite que grupos de pessoas descrevam redes
sociais sem precisar de banco de dados centralizado.
[26]Ver
em: OpenRank
[27] Gyöngyi, Zoltán; Hector Garcia-Molina, Jan Pedersen. “Combating Web
Spam with TrustRank”, in: Proceedings of the International Conference on Very
Large Data Bases, 2004
[28]
A chamada acumulação original, ou acumulação primitiva, ainda está viva no
núcleo duro da história do capitalismo que conhecemos, como nos alerta Sandro
Mezzadra (MEZZADRA, Sandro. La condizione postcoloniale. Storia e politica
nel presente globale, Verona: Ombre Corte, 2008).
NOTAS
DOS TRADUTORES
[I]
“Capitalismo cognitivo”, como “economia cognitiva” – que se ouvem e leem-se
muito frequentemente no Brasil, são expressões semanticamente erradas (e,
pode-se dizer, são erradas em todas as línguas nas quais apareçam, porque são
erradas no plano semântico). Nem a “economia do conhecimento” é
propriamente cognitiva, nem o “capitalismo do conhecimento” é, bem
feitas as contas, cognitivo. O capitalismo do conhecimento é,
necessariamente, por definição, capitalismo capitalista, o qual pode
operar e opera, claro, também sobre o conhecimento. O absurdo no plano semântico
aparece mais claramente à intuição dos falantes, se se pensa na expressão
“capitalismo [por exemplo] nutritivo” – quando o que se quer dizer é
“capitalismo da nutrição”.
Há
muito complexas questões semânticas e lógicas (que obrigariam a uma complexa
análise da semântica do atributo, ou semântica da adjetivação)
envolvidas na análise dessa terminologia, que não se podem expor e discutir
em samba curto.
Mas fica aqui anotado o problema – um primeiro resultado
produtivo do difícil trabalho para traduzir esse artigo que obriga a tatear em
terreno muito pouco explorado por nós.
A
observar ainda, trazendo água para o nosso moinho de rigor terminológico, que na
nota 18 (vide), por insondáveis motivos, a tradução para o inglês anota,
pela primeira vez, “economia do conhecimento”, knowlege economy, e não
fala de ‘economia cognitiva’. O mesmo vale para o título em italiano do livro lá
citado: Economia della conoscenza [economia do
conhecimento].
[II]
“Indústrias Criativas” também é expressão errada e pelos mesmos
argumentos lógico-semânticos que se aplicam aos sintagmas “capitalismo
cognitivo” e “economia cognitiva”. As indústrias ditas “criativas” não são
absolutamente criativas: são indústrias do sistema do capital e,
portanto, são, no plano lógico-semântico da definição, indústrias lucrativas.
Que essas indústrias produzam mais-valia a partir de alguma “criação”,
absolutamente não as torna diferentes da indústria de automóveis, por exemplo,
que também, afinal de contas, deve ser dita criativa, se cria
automóveis.
Pretender
que as especificidades da criação pelo espírito humano dita “criação artística”
“contaminariam” e dariam alguma “nobreza” extra a alguma indústria e a alguma
mais-valia é deixar-se prender numa arapuca ideológica que, nesse caso,
manifesta-se na e pela língua. Pode-se pensar, sem violência semântica, em
“Creative Commons”, isso sim. Mas não se pode pensar em “indústrias criativas”,
nem em “capitalismo criativo”, expressões que beiram (quando não naufragam
neles) o oximoro, a contradição em termos, a aporia.
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