terça-feira, 22 de maio de 2012

Intolerância: "Direitos Autoral" usam justiça para fechar site

Buscado no Boilerdo 

Fonte: Descurvo 



O  famoso site Livros de Humanas, mediante o qual se pode ter livre acesso ao conhecimento - por meio de links que conduzem, gratuitamente, a acervos de livros digitalizados -, está fora do ar sob a alegação que sofreu notificação judicial daAssociação Brasileira de Direitos Reprográficos(ABDR). Basicamente,  aABDR move uma ação de perdas e danos, no valor de R$ 10.000,00, em nome das editoras Contexto e Forense, filiadas duas, pelo fato de que dois livros delas podiam ser acessados pelo site - um deles, ironicamente, sobre psicose paranoica -,  com pedido cumulado de tutela antecipada para a retirada das obras da rede, sob o ônus de aplicação de multa diária de R$ 500,00, enquanto estiverem lá. O réu da ação é uma pessoa física identificada como suposta proprietária do site.

Isso reabre o debate sobre direitos autorais - que, afinal de contas, é uma das pedras de toque do capitalismo cognitivo: encalacrar a produção (imaterial), que representa uma parcela cada vez maior do valor econômico, em termos jurídicos para determinar que a remuneração do "autor" (na verdade, das editoras, gravadoras e afins) esteja hierarquicamente acima do acesso ao conhecimento, à cultura e à informação. 

A circulação desses bens de primeira necessidade torna-se condicionada ao pagamento de vassalagem ao capital, que captura sua produção. Trata-se de uma contradição em termos curiosa, uma vez que o aparato legal e judicial não protege verdadeiramente os autores, muito mal remunerados pelas gravadoras, editoras e todo o circuito comercial, mas dá àquelas primazia de remuneração mesmo sobre a necessidade social de acesso ao conhecimento.

O direito autoral termina por ser menos autoral do que seu nome suscita e mais um simples regulamento para a exploração, controle e disposição dos bens imateriais, sua produção e circulação, pelo capital. Se um direito enuncia, simultânea e automaticamente, uma obrigação, aquela que decorre daqui é que a sociedade está obrigada a pagar para um setor para ter acesso à cultura que ela própria produz de modo comum. 

Na melhor das hipóteses, temos (a meia-dúzia de) medalhões da indústria cultural, a auto-intitulada "classe artística", detentora de gravadoras ou editoras próprias, capitalizando brutalmente em cima da sua própria obra das mais diversas maneiras, acomodando-se em produzir - mas essa sequer é a regra, uma vez que a maioria de artistas e afins são meros empregados - isso sem falar que o fato do direito autoral transcender à vida do "artista", mantendo sua obra como domínio privado, constitui-se em um sumo estupor.

Há uma multidão de jovens que dependem de cópias e xerox para estudar, trabalhar, viver e  mesmo a reprodução sem fins lucrativos é vedada; o sistema que nega acesso a esses bens, por outro lado, é aquele mesmo que precisa, para sobreviver, capturar uma produção que demanda, por sua vez, uma circulação cada vez mais rápida e melhor do conhecimento comum.  No Brasil, a ABDR é apenas um dos braços desse esquema parasitário que, hoje, possui bastante força graças ao esquema do ECAD - agora firmemente ancorado no Ministério da Cultura na gestão Ana de Hollanda.  

Não se trata, por óbvio, de excluir um sistema de remuneração para quem produz arte, cultura ou informação, mas sim de saber que o autor não é um sujeito transcendental que produz do nada: ele o faz a partir do que é produção comum da sociedade onde vive, logo, torna-la um ente meramente privado trata-se de um atentado à própria continuidade do processo produtivo: a circulação não pode estar posta em função da remuneração, mas sim a segunda é que precisa ser adequada à primeira. Mesmo que esse autor ainda pudesse ser considerado como tal, reitero, não é para ele, via de regra, que a correnteza é vertida.

Para além dos problemas todos concernentes à juridicização da Vida, ainda assim, à luz dos princípios constitucionais vigentes e decantados, é de causar surpresa à tolerância com a legislação vigente, seja por parte dos legisladores ou dos próprios tribunais - que podem e precisam, eles mesmos,  dar interpretação adequada frente à Constituição vigente, embora costumem ser até mais realistas do que o rei (o que é sintomático, aliás). O prejuízo social com o fechamento do Livros de Humanas, que já foi ensaiado há tempos, até agora, resta não calculado ou não considerado nas planilhas, o que não é nada à toa.

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